Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio em 11/10/2011
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O artigo 368 do Novo Código Civil diz que “se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem”. A obviedade dessa afirmação salta à vista de qualquer pessoa com um mínimo de discernimento. E o legislador foi sucinto e direto devido ao fato de não haver absolutamente nada a acrescentar ou especular. O estado de lucidez que permitiu a elaboração desse artigo só foi possível porque ele é destinado às relações que não envolvem o poder público. Quando o mesmíssimo assunto abrange as entidades fazendárias a coisa muda completamente de figura. O artigo 374, vizinho do 368, que tratava da compensação de dívidas fiscais e parafiscais, foi revogado pela lei de um artigo só e meia dúzia de palavras, a de número 10.677/2003. A exposição de motivos para tal revogação está na E.M. 26, de 09/01/2003, que menciona o comprometimento da estabilidade fiscal e graves prejuízos ao erário.
O Código Tributário Nacional, que deveria estabelecer um mínimo que fosse de justiça fiscal, é utilizado pela própria Fazenda Nacional para negar o exercício do direito de compensação tributária. O legislador, obedecendo fielmente a E.M. 26, tratou de criar um cipoal de regulamentações legais denso e entremeado com o objetivo de dificultar ao extremo o acesso do contribuinte ao dinheiro de sua propriedade retido nas mãos do Fisco. Atitude que afronta a nossa toda remendada CF/88, Art. 5, XXII, que afirma que “é garantido o direito de propriedade”. Ou seja, a PROPRIEDADE é o crédito reconhecido e homologado pela SEFAZ, por exemplo, que mesmo o contribuinte possuindo um milhão de reais a título de ICMS represado no órgão, continua sendo obrigado a pagar cem mil reais de ICMS mensalmente; algo que empresário nenhum engole por mais que se apresentem duzentas mil páginas de legislação justificando o injustificável.
A Receita Federal do Brasil tem evoluído positivamente nessa questão, inclusive permitindo a compensação entre tributos de naturezas diferentes. As legislações fazendárias de São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais são mais maduras que a nossa e demonstram maior disposição em respeitar o contribuinte e conferir mais racionalidade na sua aplicação. Deduz-se, dessa forma, que a legislação federal que está hierarquicamente posicionada acima das legislações estaduais, deixou a cargo dos estados a missão de tratar do assunto compensação tributária da forma que lhes convier. É como se houvesse um ranking de estados mais atrasados e mais evoluídos em matéria tributária. No frigir dos ovos, o tal cipoal legislativo é resultado de uma grande orquestração de legisladores que trabalharam intensamente na criação de um gigantesco e complexo labirinto de falácias e sofismas para dar um ar de legalidade à negação do direito de compensação tributária; algo muitíssimo parecido com o papo do malando escorregadio que faz de tudo para não pagar o que deve. Cabe a cada um de nós reagir, amparados pelo inciso LXXIII, do artigo 5º, da nossa Carta Magna, que diz o seguinte: “qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo à moralidade administrativa”.
Como o Estado brasileiro não pode negar o direito aos seus cidadãos, as administrações fazendárias transmitem aos lesados e espoliados contribuintes, a mensagem de que a única alternativa é recorrer ao Judiciário. Claro, como é sabido até dos cachos de tucumãs pendurados lá no mato, a justiça brasileira é uma ficção. E as entidades fazendárias conscientes disso, sabem que o crédito de uma infinidade de contribuintes continuará represado. Mesmo que um ou outro gato pingado sem juízo acione a Justiça, as finanças do erário não serão impactadas. Dessa forma, os signatários do E.M. 26, os senhores Márcio Thomaz Bastos e Antonio Palocci Filho poderão dormir despreocupados.
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