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domingo, 26 de abril de 2020

ALMA BANDIDA



Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  28 / 04 / 2020 - A399

Dona Fran é uma simpática costureira que atende seus clientes com um belo sorriso no rosto. Certa vez, eu levei uma calça para embainhar. Enquanto concluía o serviço, ela fez um comentário emblemático. Disse que um catador de recicláveis colocava areia nas latinhas amassadas para aumentar o peso e assim ganhar um pouco mais de dinheiro. Dona Fran discorria sobre essa história com desenvoltura e certa admiração pela ideia genial do catador.

Se quiser conhecer a alma de um país, basta prestar atenção nos seus políticos. O sistema político sintetiza o caráter de uma nação. E o motivo é bem simples. Os piores políticos brasileiros, por exemplo, não vieram do planeta marte nem das profundezas do inferno; eles foram paridos das massas. O voto representa um alinhamento de caráter com o votado. O político eleito, portanto, está em perfeita sintonia com os valores daqueles que o elegeram. Trocando em miúdos, cada eleitor faria exatamente aquilo o empossado faz. É claro e óbvio que o seu João das couves ou o pastor da igreja não seriam capazes de abominações características do universo político. Será mesmo?

Será que alguém que coloca areia nas latinhas também seria capaz de grandes desvios, se tivesse oportunidade? Será que a Dona Fran seguiria na mesma linha? Pois é. Quem reclama da corrupção desenfreada é gente que acha normal, a prática de “pequenos deslizes” (ou grandes). É mais ou menos assim: O macaco que segue atrás, debocha do rabo do macaco que vai na frente. É muito estranho, acompanharmos décadas e mais décadas de protestos contra a corrupção enquanto o sistema corrupto ganhou musculatura nesse mesmo período. Pesa aqui o velho ditado: Por fora, bela viola; por dentro, pão bolorento. Essa pantomima ignóbil ficou ainda mais evidente no episódio rocambolesco da demissão do senhor Sérgio Moro.

Os partidários do presidente apoiaram incondicionalmente tudo que ele fez, ao mesmo tempo em que desqualificaram o ministro, que agora é um bandido. No fundo, todos sabem quem está mentindo. Mas o que pesa na balança é o pragmatismo, que não deixa espaço para outro tipo de conduta moral. Na visão dos apoiadores ardorosos, o presidente pode tranquilamente interferir nos inquéritos da Polícia Federal (ele pode tudo). Ele pode demitir quem quiser, a qualquer instante, principalmente quem investiga seus amigos e familiares. Isso é perfeitamente normal. Também é normal, um patrão habituado a demitir funcionários aleatoriamente, como se fosse uma roleta russa. É claro que isso é insano e condenável numa empresa. É claro que isso joga rapidamente a empresa no precipício. Mas para os bolsonarianos tudo é perfeitamente normal.

O mosaico de personalidades tortuosas é o laboratório perfeito do político desonesto. A arte da política se traduz num profundo conhecimento da alma do eleitor. O político moderno não precisa envidar grandes esforços para convencer ninguém sobre contos de fadas. O político sabe que seu eleitor tem uma alma bandida. Mesmo porque, a sociedade está mais descarada; as pessoas estão abandonando os estereótipos romantizados e assumindo um comportamento pragmático. Afinal de contas, o mundo é dos espertos. E no jogo da esperteza vale tudo. Quem ainda insiste na profissão de bondade aprende no BBB que é preciso mentir, trapacear, agredir e passar por cima dos brothers para ganhar o jogo. O pior de tudo é que desse caldo de ignomínias nascem as escolhas dos políticos que conduzem o destino da nação. Portanto, o nosso sistema político seguirá imutável e o noticiário continuará entupido de manchetes tenebrosas.

Tempos atrás, o maior empresário do comércio local disse que entrar na política é entrar na lama. Daí, que pessoas cuidadosas e honestas fogem da política partidária, restando aos facínoras a tarefa de ocupar os espaços abandonados pelos cidadãos honrados. O Juiz Sérgio Moro saiu do governo porque se manteve fiel aos seus princípios. Os políticos e seus agregados sabem que discurso é apenas um meio de conquistar o poder. As regras vigentes nos bastidores são bem diferentes daquilo que é dito nos palanques. Todo mundo sabe disso. O Juiz cometeu o grave erro de atuar nos bastidores da mesma forma que age publicamente. Os partidários do presidente não toleram isso. Ou seja, o ex-ministro deveria ter se ajustado aos esquemas políticos. Quem não se ajusta, não sobrevive em canto nenhum. Curta e siga @doutorimposto



































terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

DEIXA O COMÉRCIO TRABALHAR



Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  18 / 02 / 2020 - A389

Em uma das provas do quadro “Força Bruta” (Globo Esporte) exibido domingo passado, os competidores arrastavam um conjunto de correntes que pesava 300Kg. Mesmo sendo homens gigantes, era visível o desgaste e a dificuldade para cumprir um percurso de poucos metros. O sofrimento estampado no semblante dos atletas era a imagem perfeita do empresário obrigado a se movimentar amarrado aos pesados ICMS, Pis, Cofins, IPI, Cide, ISS, SPED, DAM, DAS, DIRF, DCTF, Taxas infinitas etc. Todo esse quadro embaraçoso é muito bem caracterizado no relatório Doing Business 2010 divulgado pelo Bird (Banco Mundial) que aponta o emblemático volume de 2.600 horas necessárias para o contribuinte brasileiro acertar suas contas com o Fisco. Nesse trabalho de pesquisa envolvendo 183 países, o contribuinte dos Emirados Árabes gasta somente 12 horas; na Inglaterra, são 110 horas; na China, 338 horas.

A burocracia infernal é o peso que mata qualquer chance de mobilidade do empresário brasileiro, que, sem agilidade nenhuma, perde feio para os competidores internacionais. Daí, que é impossível competir com produtos importados ou com empresas estrangeiras que se instalam por aqui amparadas por generosas renúncias fiscais. Para sobreviver, o comerciante brasileiro atua como os soldados vietnamitas que lutaram contra o gigante norte americano na segunda guerra mundial. Isto é, o contribuinte atua como um guerrilheiro nas sombras para escapar do Fisco. O comerciante brasileiro extrai leite de pedra; os sobreviventes se mantêm na ativa contrariando todas as possibilidades de funcionamento. As histórias de bastidores envolvendo expoentes do nosso comércio local são repletas de operações mirabolantes e de manobras extremamente arriscadas (coisa de filme hollywoodiano). Mas é aquela velha história: O Brasil não é para amadores.

A razão desse estado calamitoso em que vivemos está no indecifrável sistema de tributação sobre consumo e sua longa cadeia de repercussão, desde a extração, passando pela industrialização, distribuição, até chegar ao varejo. Nesse longo e acidentado caminho acontecem terremotos, inundações, chuva de meteoros etc. É um descalabro, a quantidade de normatizações conflituosas que mergulham profundamente no detalhamento do detalhamento do detalhamento de cada produto comercializado. São milhares de codificações, enquadramentos, exceções, redundâncias, sobreposições e conflitos que arrastaram o sistema inteiro para o Judiciário. A nossa realidade cotidiana deixa claro que a jurisprudência se agiganta sobre a norma. As empresas mais robustas operam em cima dum vasto suporte judiciário. E quanto às pequenas, resta a tenacidade e a argúcia de trabalhar meio que na clandestinidade (ou é isso ou é morte certa). Cumprir vírgula por vírgula do sistema tributário é simplesmente impossível.

Pois é. Estamos agora vivendo o exato momento de abertura do portal interestelar que vai se fechar logo, logo. Temos a chance preciosa de varrer a sujeira normativa e assim construir uma nova sistemática tributária enxuta, justa e eficiente. Estamos com a faca e o queijo na mão diante da oportunidade para aniquilar o monstro apocalíptico que mantém o contribuinte preso a grossas correntes burocráticas. O modelo ideal de tributação indireta é o Imposto sobre Vendas a Varejo norte americano. Mas como isso é inviável no Brasil (os estados produtores não querem perder arrecadação), que então se cobre parte na origem e o restante na entrada do Estado consumidor, numa espécie de substituição tributária para tudo. A ideia é que TUDO seja cobrado na entrada, porque, desse modo, o comércio inteiro ficaria dispensado de qualquer taxação sobre vendas. Ao mesmo tempo, o comércio não teria que gerar relatórios e mais relatórios sobre infinitos detalhamentos das suas mercadorias. Em outras palavras, o Fisco deixaria o comércio livre para trabalhar. Mesmo porque, a dupla Sefaz/RFB nunca, jamais, conseguirá evitar que as normas do mercado sejam ditadas pelo sonegador.

O modelo de tributação indireta baseado no IVA que se mantém firme e forte nas propostas em tramitação no Congresso Nacional, pretende conservar (ou piorar) o enrosco burocrático hoje existente. No processo de Reforma Tributária, a luta deve ter como alvo preferencial o diabólico jogo de débito versus crédito que repercute ao longo da cadeia de produção/distribuição. Curta e siga @doutorimposto




































terça-feira, 22 de outubro de 2019

EXTORSÃO OFICIAL DE ICMS



Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  15 / 10 / 2019 - A397
Artigos publicados

Uma estupenda fonte de recursos abastece os cofres da Sefaz. Trata-se da infinidade de cobranças indevidas de ICMS lançadas no Domicílio Tributário Eletrônico do contribuinte. Vamos ao primeiro exemplo: A Companhia Sulamericana, localizada na cidade de Duque de Caxias, RJ, emitiu a nota fiscal 9564 em 28/06/2019 para seu cliente manauara localizado na Avenida Desembargador Paulo Jacob. Valor dos produtos R$ 18.726,00; Valor do IPI R$ 60.007,80; Valor do ICMS-ST R$ 7.677,66; Valor total da NF R$ 86.411,46. O IPI não compôs a base de cálculo da substituição tributária de R$ 7.677,66 que foi calculada de acordo com as normas contidas no Convênio 111/2017. A Companhia Sulamericana não cobrou ICMS-ST sobre o IPI porque o parágrafo 2 do artigo 13 da Lei Complementar 87/1996 veda a inclusão do IPI sobre a base do ICMS nas operações entre contribuintes do imposto. Mas, se por acaso, a NF 9564 fosse emitida sem destaque de ICMS-ST, a Sefaz/AM efetuaria a cobrança do imposto pelo valor de R$ 36.481,80 via lançamento em DTE. O IPI é o responsável pela brutal diferença de R$ 7.677,66 para R$ 36.481,80. A Sefaz/AM cobra ICMS-ST sobre IPI (imposto sobre imposto); inclusive, cobra antecipação DIFAL sobre IPI, o que é mais absurdo ainda.

Outro caso ainda mais assustador ocorreu tempos atrás. O produto “preparado para fabricação de sobremesa” foi taxado com alíquota de 79,84% a título de ICMS-ST. A proprietária da empresa fez um escândalo na Sefaz. Mesmo assim, todos os funcionários apontaram o item 24 do Anexo IIA do RICMS (MVA 328%) como justificativa para o absurdo da cobrança. Todos os funcionários sabiam que a cobrança estava errada, mesmo assim tentaram dissuadir a empresária porque ela não era tributarista. Os funcionários da Sefaz sabiam que o item 24 trata de sorvete e não de sobremesa. Existe uma ordem superior que proíbe qualquer funcionário de ajudar o contribuinte a pagar menos imposto. Foi então que, eu, autor desse artigo, desenvolvi um argumento técnico que baixou o imposto de 79,84% para 11%.

Neste ano, a Sefaz enquadrou um componente de câmara frigorífica como ventilador, sob argumentação de que tudo que gira é ventilador. Eu contra-argumentei dizendo que se tudo que gira é ventilador, então pneu é ventilador. Foi assim que a Sefaz recuou na cobrança errada, aceitando mudar de substituição tributária para antecipação Difal.

A Sefaz cobra das empresas de refrigeração, ICMS-ST de autopeças ou materiais de construção etc., mesmo não havendo CNAE dessas atividades no contrato social. A Sefaz também classifica produtos hospitalares como autopeças etc. A Sefaz ainda cobra ICMS-ST das cozinhas industriais e depois cobra ICMS da alimentação pronta. Ou seja, cobra antes e cobra depois, o que é proibido, uma vez que a substituição tributária só deve ser cobrada uma única vez. O pior é que meio mundo de empresas pagam horrores de imposto indevido por desconhecimento técnico.

A Sefaz cobra também ICMS-ST autopeças de estabelecimentos do ramo de marcenaria. Até produtos utilizados no revestimento de móveis são classificados como material de construção. Empresas do ramo de marcenaria ou de refrigeração não devem de forma nenhuma pagar substituição tributária, a não ser que vendam ferramentas ou alguns materiais específicos que possam ser utilizados por eletricistas, como fita isolante ou chave para teste de voltagem etc.

Meus alunos me contam histórias escabrosas envolvendo cobranças absurdas da Sefaz. O pior, é que eles me relatam os horrores que passam quando tentam questionar tais abusos. Eu sempre digo que é preciso lutar pela legalidade. Ou seja, não fugir da tributação com manobras sonegadoras nem também pagar além da conta. É preciso insistir na luta pelo direito do contribuinte de não ser extorquido nem achacado nem humilhado pela Sefaz. Tenho uma lista bem organizada de barbaridades que poderiam compor um livro bem robusto; cada caso arquivado em pastas individualizadas no computador. Meus alunos me passam muita coisa.  

Em meio a tantas histórias dantescas, conclui-se que a burocracia exacerbada tem um propósito bem definido, que é criar um ambiente de pura subjetividade. Essa artificiosa e maliciosa subjetividade confere poderes titânicos ao burocrata sefariano que se reveste da autoridade divina para cobrar o que quiser e da forma que bem entender, já que não existe regra objetiva. Como bem disse o jurista Eurico di Santi, norma demais é como norma nenhuma. Curta e siga @doutorimposto



































segunda-feira, 14 de outubro de 2019

MÁQUINA DE PERPETUAR DESIGUALDADES



Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  15 / 10 / 2019 - A377

O polêmico assunto envolvendo o ingresso do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico ilustra de forma indelével o espírito matreiro dum povo viciado na manha do jeitinho. Estamos falando duma nação que não fez o dever de casa e mesmo assim insiste na pretensão de integrar o clube dos ricos. Tal situação lembra bem aquele aluno que vai para a faculdade, não para estudar, e sim, para obter o diploma. Na televisão, observa-se filas e filas de desempregados, onde muitos deles mal sabem se expressar minimamente, apesar de tantos recursos de aprendizagem disponíveis em plataformas de fácil acesso, como o próprio smartphone.

Pois é. A característica mais acentuada e a que mais nos distancia da OCDE é a nossa brutal desigualdade social, a qual está intimamente vinculada à opção pelo modelo regressivo de tributação. A sociedade brasileira é empobrecida pela esmagadora carga de impostos escondida nos produtos que consumimos diariamente; principalmente, alimentos básicos. O trabalhador recebe líquido somente 60% daquilo que é gasto pelo seu empregador e depois tem metade da sua renda abocanhada pelos impostos indiretos, sobrando assim uma ínfima quantia para construção de algum patrimônio. O resultado desse perverso regime semi-escravocrata é traduzido num potencial de consumo sufocado pela desigualdade social.

Interessante, é que as propostas de reforma tributária em debate no Congresso Nacional são focadas única e exclusivamente na intensificação da regressividade, onde, por exemplo, a PEC45 quer aumentar o imposto sobre serviço de 5% para 25%. O ministro Paulo Guedes só fala em redução do imposto de renda. Conclui-se então que todas as forças se unem para aumentar a regressividade e diminuir a progressividade. E é com essa deformação jurídico social que o Brasil quer por que quer entrar na OCDE, onde a carga média do imposto de renda é de 37% e o peso dos tributos sobre consumo é de 25%. No Brasil acontece exatamente o contrário: o percentual de tributação sobre a renda é de 18% enquanto que o consumo responde por 51% do bolo arrecadatório. Ou seja, os números falam por si, não deixando margem para qualquer divagação tecnicista ou filosófica que tente justificar o nosso regressivo e perverso modelo tributário.

Quem está por trás da PEC45 é um conglomerado de grandes empresas patrocinadoras do projeto legislativo que não quer pagar imposto de renda. Por isso, comprou a reputação de renomados tributaristas para defenderem a renda e o patrimônio dos ricos. Curiosamente, essas grandes empresas querem vender para uma população que não tem dinheiro pra gastar. Mais curioso ainda é tentar entender o que pensam os magnatas que insistem num modelo regressivo que mata a capacidade de consumo da massa populacional. Os EUA, por exemplo, são pujantes economicamente por causa do intenso consumo das famílias que podem comprar muito porque os produtos são minimamente tributados. E para dinamizar mais ainda o ambiente econômico, as fábricas e os distribuidores estão completamente livres de qualquer tipo de imposto indireto, ficando somente o varejista responsável pela retenção e o repasse do imposto ao erário, num processo onde não se perde tempo com apuração de imposto. Isto é, tudo é simples, rápido, claro e eficiente.

O aspecto mais preocupante da discussão envolvendo reforma tributária diz respeito ao fato de que ninguém vai legislar contra o seu holerite. As pessoas envolvidas no projeto são ricas e por isso mesmo não vão aumentar imposto para si próprias. Daí, que a taxação de altas rendas e de grandes patrimônios é assunto absolutamente proibido. Corremos o risco de nos distanciar mais ainda dos requisitos necessários para ingresso na OCDE se continuarmos operando um sistema de autofagia. O prognóstico visível no horizonte é de aumento brutal dos tributos indiretos com reflexos na redução dos salários e nos aumentos de energia elétrica, combustíveis, telefone e bens de consumo em geral. A mesmo tempo, o custo burocrático e jurídico ficará pior, uma vez que a PEC45 diz que passaremos dez anos convivendo com o sistema atual e com o substituto. Que Deus tenha piedade das nossas almas. Curta e siga @doutorimposto



































terça-feira, 4 de junho de 2019

A FALÁCIA DA REFORMA TRIBUTÁRIA



Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  4 / 6 / 2019 - A363

A tão debatida Reforma Tributária que ocupa espaço nas discussões políticas e empresariais pode gerar um resultado frustrante em face da expectativa almejada por vários segmentos da sociedade organizada. O que se tem de concreto, no momento, é apenas uma proposta de unificação dos tributos indiretos. Na realidade, duas proposições: A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019, já aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados; e também o Projeto do Executivo Federal que pretende unificar somente os tributos federais. A PEC45 pretende criar o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), o qual unificará Pis, Cofins, IPI, ICMS e ISS. O gargalo desse projeto está no pacto federativo, que contempla a autonomia tributária de Estados e municípios e que envolve meio mundo de particularidades e interesses regionais. A se considerar essa realidade, temos um nó difícil de desatar. O nosso sistema tributário cresceu e se expandiu como uma metástase cancerígena, tornando-se uma missão improvável, a cura do paciente terminal. O que vivenciamos na prática é uma profusão de regras estaduais impossíveis de serem alinhadas numa unidade normativa. Pesa também, a feroz disputa de interesses arrecadatórios e o intrincado jogo político dos incentivos fiscais. É como se o país inteiro fosse um extenso campo minado.

De acordo com o idealizador do IBS, o economista Bernard Appy, a substituição dum modelo pelo outro aconteceria no período de dez anos, sendo que, num horizonte de 50 anos, migraríamos para a tributação integral no destino de consumo do produto. O problema desse tipo de projeto é que somos acostumados ao frenesi normativo do legislador tributário. Também, vivemos num eterno estado de convulsão política, onde uma hora é dum jeito e outra hora é de outro jeito. Para entornar mais ainda esse caldo de jiló com rapadura, o nosso ambiente jurídico é frágil e muito suscetível a solavancos interpretativos. Daí, que ninguém acredita em projetos de longo prazo; nenhuma empresa apostará seu patrimônio numa ideia que precisa de 10 ou de 50 anos para gerar frutos. No Brasil, não existe política voltada para espécies tributárias ou vocações regionais. O que funciona, são as arquiteturas direcionadas para contribuintes específicos. Nosso código tributário é sob demanda, construído de acordo com o poder de influência das grandes corporações. A estrutura normativa contém um gigantesco volume de Regimes Especiais, que muitas vezes são enigmáticos e mantidos longe do alcance dos tribunais de contas.

Curiosamente, em meio a tanta discussão, pouco se fala da raiz primordial das mazelas tributárias, que é o gasto público. Não se pode falar de redução da carga de impostos sem se buscar meios de racionalização da máquina pública, que cresceu exponencialmente nas últimas décadas; principalmente nos governos petistas. A coisa toda chegou num nível de ruptura, tipo, ou se dá um freio, ou caímos todos no precipício. Eis alguns exemplos da completa desordem das contas públicas: “Senado gasta R$32 milhões em mesadas para filhas solteiras”; “Salário de conselheiro do TCE mato-grossense varia de R$102 mil a R$183 mil”; “Verbas indenizatórias garantem salário de mais de R$700 mil em maio a juiz do Tribunal de Justiça de Minas Gerais”; “Conselheiro do TCE-MG gasta R$729 mil em mestrado não concluído”; “Despesas previdenciárias abocanham 57% do Orçamento da União, cujos estudos apontam que em 2024 esse percentual chegará a 82%”. Tantos números pornográficos evidenciam o grau avançado de desordem administrativa do poder público, que trabalha unicamente para fomentar o mais perverso mecanismo de transferência de renda do planeta. Ou seja, nunca, em toda a história da humanidade, tanta gente pobre trabalhou tanto para enriquecer uma casta privilegiada de agentes públicos.

Pois é. Diante desse quadro apocalíptico, o que deve se fazer é colocar as cartas na mesa e perguntar para o pagador de impostos: - Você quer continuar se matando de trabalhar para sustentar os luxos e as extravagâncias dos agentes públicos? Pesa nesse momento, uma reflexão sobre a abertura da caixa de pandora para a população em geral. Pra começo de conversa, as autoridades competentes deveriam aprovar com urgência O PL 990/2019 do senador Randolfe Rodrigues, que propõe separar imposto de produto nas etiquetas de preços. Dessa forma, o consumidor iria apontar os caminhos para uma verdadeira reforma tributária. Curta e siga @doutorimposto
















segunda-feira, 13 de maio de 2019

ESCALADA DOS IMPOSTOS INDIRETOS




Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  14 / 5 / 2019 - A361

Analisando-se a escalada dos preços ao longo da cadeia de produção/distribuição é possível constatar o brutal impacto dos tributos indiretos sobre o bolso do consumidor. Por exemplo, numa curta cadeia (indústria, atacadista, varejista, consumidor) uma mercadoria nacional que sai da indústria paulista com o preço de R$100,00 destacado no total da NF, chega ao consumidor manauara por R$448,01. Nesse caso, a carga final embutida de impostos é de 40,32%. Separando-se imposto de produto, temos uma carga real de 67,56%. Se nessa cadeia for acrescentada a figura do distribuidor antes do atacadista, o consumidor terá que pagar R$866,84. Com isso, a carga embutida sobe para 46,34% e carga real vai para 86,36%.

Num cenário de total isenção dos tributos sobre consumo, o preço sem o distribuidor ficaria em R$230,42. Na presença do distribuidor teríamos R$333,70. Resumo da ópera: Com imposto R$866,84; sem imposto R$333,70. Ou então: Com imposto R$448,01; sem imposto R$230,42.

Essa política arrecadatória é mais perversa quando aplicada sem critério algum sobre os alimentos. O Amazonas é a unidade federativa que mais tributa a cesta básica. O pobre lascado de renda miserável que poderia gastar R$230,42 numa compra de alimentos, acaba pagando R$448,01 por causa da tributação regressiva. Dessa forma, a Sefaz/RFB retira metade da comida da boca das famílias pobres. Quem tem rendimento mensal de R$30.000,00 pouco sofre com esse sistema tributário. Nos EUA, nenhum tipo de alimento paga imposto algum.

Há uma corrente doutrinária que defende a cobrança dos tributos sobre consumo somente no final da cadeia de produção/distribuição, onde, de fato, ocorre o consumo. Atualmente, os impostos sobre consumo incidem também na produção e na distribuição. Vale ressaltar que os números aqui apresentados poderiam ser piores, já que não se está considerando o tributo IPI que o consumidor amazonense paga quando a mercadoria é importada. Se os tributos sobre consumo fossem cobrados somente sobre o consumo, não haveriam alíquotas interestaduais de ICMS nem repercussão tributária do produtor ao varejista.

Num cenário de cobrança aplicada somente no final da cadeia de produção/distribuição, o consumidor manauara pagaria R$340,61. Havendo participação do distribuidor, o preço ficaria em R$493,29. Nesse cenário matemático, a carga final embutida seria de 21,65% e a carga real (imposto separado do produto) ficaria em 27,50%.

Nessa simulação matemática foram consideradas as seguintes premissas: 1) Regime IRPJ Lucro Real para a indústria, o distribuidor e o atacadista; 2) Regime IRPJ Lucro Presumido para o comércio varejista; 3) O estabelecimento que trouxe a mercadoria de São Paulo só pode aproveitar crédito de ICMS; 4) Foi considerado o custo operacional de 20% para todos os estabelecimentos comerciais; 5) Para obtenção de 10% de lucro líquido, o atacadista e o distribuidor aplicou no cálculo 15,15% de lucro bruto, enquanto que para o varejista foi utilizado o percentual bruto de 13,08%; 6) Em todas as cadeias de distribuição foram utilizados os créditos legais e ao mesmo tempo embutidos os impostos devidos. Os cálculos estão numa planilha que pode ser baixada no site www.doutorimposto.com.br

Outra característica medonha dos tributos indiretos é que, ao mesmo tempo em que são calculados sobre o preço de venda, eles também compõem toda a formação desse preço de venda. Daí, que ICMS, Pis e Cofins são base do ICMS; ICMS, Pis e Cofins são base do Pis; ICMS, Pis e Cofins são base da Cofins. É o que se chama de tributo sobre tributo. Lembrando, que o IPI é antes acrescentado ao custo de aquisição quando a mercadoria é importada. Nas localidades que não possuem incentivos fiscais, a incidência do IPI não segue essa particularidade da ZFM. Outra questão ainda mais perturbadora tem a ver com a incidência de quatro tributos sobre uma mesma base (bis in idem). Sendo assim, o consumidor paga IPI, Pis e Cofins para a Receita Federal e depois paga mais ICMS para a Sefaz.

Essa voracidade arrecadatória se traduz numa sociedade empobrecida pela extorsiva carga tributária dos bens de consumo. Por isso é que tudo no Brasil é muito caro. O brasileiro honesto trabalha dez vezes mais do que um americano para comprar o mesmo objeto. É por conta de tantos impostos que observamos na internet a brutal discrepância de preços entre o Brasil e os EUA. Curta e siga @doutorimposto


























terça-feira, 13 de novembro de 2018

MIREM-SE NO EXEMPLO DE SC/GO



Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  13 / 11 / 2018 - A346

Por anos a fio o legislador tributário se especializou na criação de aberrações jurídicas. As confusões infinitas do famigerado Finsocial é um bom exemplo dessa sopa do capeta. Outro instituto que nasceu aleijado é a modalidade do ICMS substituição tributária. Mas nada se compara às antecipações que colocam as empresas do Simples Nacional no mesmo nível arrecadatório dos demais contribuintes. Esse tipo de exigência afronta o artigo primeiro da LC123 que estabelece “tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas”. Tais exemplos são apenas uma minúscula amostra do chafurdo normativo que contaminou por inteiro o nosso ambiente legal. E para piorar, a Sefaz permite às grandes corporações o creditamento das antecipações, mas nega esse direito às pequenas empresas. Tal comportamento demonstra uma clara intenção de sempre apoiar os grandes e ao mesmo tempo massacrar os pequenos. Mas nem todas as unidades federativas brasileiras estão amarradas a perversões anacrônicas e doentias.

O estado de Santa Catarina já oferecia um tratamento favorecido às microempresas que tinham sua carga de ST reduzida em mais de dois terços do valor autorizado pela LC123. Por tal motivo, a edição do Decreto 1541/2018 não impactou fortemente a arrecadação. Esse decreto de março desse ano retirou da ST interna uma infinidade de produtos que acabaram voltando para o regime normal de apuração. Dessa forma, as empresas se livraram dos altíssimos custos taxativos sobre aquisição de mercadoria que muitas vezes se transformavam em prejuízos quando a presunção era maior do que o fato real. Essa decisão da Sefaz/SC é consequência direta do RE 593849 que garantiu o cumprimento do parágrafo 7 do artigo 150 da CF. A reação da Sefaz amazonense ao RE 593849 foi bem diferente. Por aqui, em vez de aliviar o peso burocrático pela retirada de produtos do ICMS-ST, o corpo técnico fazendário resolveu embolotar o meio de campo retirando certa quantidade de contribuintes do sistema. Com isso, as grandes empresas se livraram do gigantesco peso tributário que onerava por demais as aquisições de mercadorias. Mas não houve clemência para as microempresas, que agora são massacradas mais intensamente com cobranças de antecipações de ICMS. Inclusive, grande parte das cobranças de ST é indevida. O erro mais comum é cobrar ST autopeças de empresa que não possui essa atividade. A lista de enquadramentos errados é longa e revoltante. Mas tudo tem o propósito de aumentar a arrecadação a qualquer custo.

Já está em vigor no estado de Goiás o Decreto 9326. Tal dispositivo, que passou a valer em outubro, permite a isenção de pequenas empresas (com faturamento de até R$ 360 mil/ano) do pagamento da diferença do ICMS na aquisição de produtos de outros estados. A expectativa do governo estadual é que 134 mil empresas sejam beneficiadas. A voracidade tributária da Sefaz amazonense jamais iria copiar essa iniciativa goiana. Mesmo porque, a infinidade de renúncias fiscais envolvendo grandes empresas precisa ser compensada no massacre dos pequenos negócios que acabam pagando a conta. Inclusive, essa caixa-preta não foi aberta para o TCE. Na realidade, existem muitas escabrosidades normativas aqui no Amazonas. O problema é que ninguém quer cutucar a onça com vara curta. Ninguém tem peito pra sacudir o vespeiro. O governador eleito até poderia tentar fazer alguma coisa, mas as evidências apontam para a manutenção do status quo. Como sempre foi e como sempre será no Amazonas, quem governa de fato são as equipes técnicas da Sefaz que levam tudo pronto para o governador assinar ou a ALEAM aprovar.

Seria oportuno que as entidades de classe tomassem alguma iniciativa que resultasse num projeto de reordenamento das regulamentações do ICMS. Mas esse tipo de ação exigiria um profundo estudo e uma criteriosa investigação da estrutura legislativa. Infelizmente, o Amazonas ainda não amadureceu o suficiente para alcançar a estatura institucional dos estados de Santa Catarina e Goiás. Nossa mentalidade ainda repousa sobre pélas de borracha cinzenta. Vamos passar ainda muitas décadas levando paulada da Sefaz. Curta e siga @doutorimposto