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segunda-feira, 17 de junho de 2019

MENTALIDADE EMPRESARIAL ANACRÔNICA



Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  18 / 6 / 2019 - A365

O operário alemão da fábrica Mercedes-Benz pode tranquilamente comprar um veículo Mercedes-Benz. Por outro lado, o operário brasileiro nem sequer cogita a possibilidade de comprar um automóvel tão caro. Isto é, nem condições de sonhar ele tem. A razão dessa gritante discrepância está na nossa brutal concentração de renda. No Brasil, 10% da população mais rica ganha 43 vezes mais do que os 10% mais pobres. Esse índice é de apenas 6 vezes nos países socialmente mais justos. O senso comum tupiniquim carrega o ranço do regime escravocrata, onde os serviçais eram classificados como animais domésticos. Ou seja, da mesma forma que alguém hoje considera esquisito enfeitar um cachorro, também era repugnante a ideia de ver um negro bem-sucedido na vida. Na realidade, era um verdadeiro sacrilégio. No Entanto e, lamentavelmente, o resquício anacrônico duma era de atrocidades vergonhosas se manifesta no comportamento das pessoas embriagadas pela soberba. No Brasil, a elite dominante luta fervorosamente para manter esse modelo colonial, onde o alvo do preconceito são os pobres, não importando a cor da pele.

Empresários estrangeiros de mentalidade evoluída querem andar de BMW, mas querem também que seu gerente seja dono de, no mínimo, um Corola novo e completo e ainda que morem numa bela casa própria. Enquanto isso, empresas brasileiras de porte gigantesco se mantém de pé graças à dedicação dum staff supercompetente, onde profissionais dedicados vivem uma vidinha medíocre – moram num apartamentinho fuleiro e dirigem um calhambeque porque o salário mal dá pra viver dignamente. Para tornar a coisa ainda mais bizarra, o patrão feliz com excelentes resultados conquistados pelo seu gerente, o leva para almoçar num restaurante caro onde o preço do vinho é maior do que o salário do condecorado.  É nesse momento que o tal gerente constata o quão deplorável é a sua vida e a vida dos seus colegas de trabalho.

Como desgraça pouca é bobagem, há casos de pessoas brilhantes que desenvolvem projetos grandiosos e ao mesmo tempo são responsáveis por guinadas acentuadas no posicionamento da empresa no mercado em que atua. Ou seja, pessoas que promovem verdadeiras revoluções na estrutura do negócio e que, depois de tudo pronto, o chefe dá um chute na bunda do coitado sem dó nem piedade. Ou então, quando não demite, o patão fica o tempo todo menosprezando o valor do empregado para humilhar a pessoa e ao mesmo tempo não deixar que ela crie asas e voe para o concorrente.

Na realidade, o que se observa no meio empresarial são ambientes tóxicos e doentios. Se você quiser decifrar a personalidade do dono, basta observar os funcionários. E como são diferentes os empregados das empresas!! Há uma grande livraria no centro da cidade onde se percebe claramente uma nuvem negra pairando na cabeça de cada funcionário. Os atendentes são esquisitos, ríspidos e assustados. Obviamente, que um ambiente tão agourento é resultado direto do comportamento tirano do dono do estabelecimento. Inclusive, quando o dono é doido, ele endoidece todo mundo. Quando o patrão é estúpido, os clientes também são tratados com estupidez pelos atendentes. Se os funcionários são despreparados para o serviço é porque o diretor é medíocre. Por isso é que alguns empreendimentos crescem num ritmo vertiginoso, como, por exemplo, uma grande rede de lojas de eletrodomésticos que conquistou o coração do manauara. Nessas lojas, tudo funciona como um relógio e os funcionários são dinâmicos e eficientes porque os donos são professores e estão antenados com o que de melhor existe no mundo. Mas a principal razão do sucesso está num programa intensivo e persistente de capacitação técnica. 

Um ambiente ruim acaba expulsando os profissionais brilhantes e ao mesmo tempo retendo os medíocres. Consequentemente, a empresa crescida por conta de fatores válidos num tempo que já passou, não consegue se adaptar aos novos tempos, onde a concorrência se adianta na correção de políticas empresariais antenadas com os paradigmas vigentes. Muitos fecham as portas porque se recusam a sair do século XIX ou então porque não aceitam o fato de seus funcionários também terem o direito de viver bem. Curta e siga @doutorimposto 



















terça-feira, 11 de junho de 2019

A CULTURA DA ESPERTEZA TRIBUTÁRIA



Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  11 / 6 / 2019 - A364

A economia brasileira é marcada pela extremada concentração de renda. Quando nos comparamos com o restando do mundo, a nossa posição é vergonhosa. Numa pesquisa feita pelo Banco Mundial em 136 países foi constatado que o Brasil ficou entre os 5 piores nesse ranking. Por alguns meros pontos, nós seríamos o povo com o pior quadro de equidade distributiva. Traduzindo para o português claro, a camada mais rica faz de tudo para crescer nas costas dos pobres. Isso fica evidente diante do fato de que os 10% mais ricos ganham 43 vezes o que ganham os 10% mais pobres. Essa diferença é de apenas 6 vezes nos países com melhor índice de equidade distributiva. Lamentavelmente, o brasileiro é pouco sensível a esse tema porque impera no Brasil a cultura da esperteza. Ou seja, é todo mundo fazendo de tudo para se dar bem; não importando a que custo. Essa é a gênese primordial do sistema regressivo que massacra as camadas mais baixas da sociedade brasileira. A professora Maria Helena Zockun afirma que conjunto de impostos regressivos incide numa base com características muito perversas por causa da concentração prévia de renda.

No Brasil, até mesmo a progressividade do imposto de Renda é escamoteada, uma vez que a média da alíquota efetiva é de apenas 7% enquanto a média da alíquota nominal é de 11,4%. E o motivo está nas deduções, regimes especiais e abatimentos, que são aproveitados mais intensamente nas faixas de renda mais elevadas. Consequentemente, acontece uma espécie de regressividade do imposto de renda no topo da pirâmide social. Isso significa que, em bases relativas de renda/taxação, as classes inferiores pagam mais imposto de renda. E como desgraça pouca é bobagem, essa classe inferior é que paga a mais elevada carga de impostos sobre tudo que consome. Por exemplo, na compra de um videogame de R$1.000 o governo fica com R$720 na forma de impostos, uma vez que o preço efetivo do produto é de somente R$280. E isso acontece com tudo que consumimos diariamente. O pobre é que sustenta o país com vários impostos escondidos em todas as etiquetas de preço.

O nosso senso comum é impregnado pela ideia de segregação entre ricos e pobres, onde qualquer projeto governamental adquire características peculiares dependendo da classe alvo dos seus efeitos sociais. Se a pavimentação é no bairro rico, tudo é executado com rigor e primazia, mas no bairro pobre, a coisa é tocada a c* de cavalo. Até mesmo as propostas de reforma tributária são marcadas pelo preconceito social, quando se alardeia a ideia de ajudar os pobres com redução da carga fiscal de alimentos e de remédios. A professora Maria Zockun lembra que numa sociedade de consumo os pobres não somente comem e ficam doentes; eles têm outras ambições. Por exemplo, a lista anterior dos produtos da cesta básica amazonense continha itens da pior qualidade possível, como se os pobres consumissem somente porcaria. Por outro lado, a Sefaz tributa violentamente qualquer alimento de qualidade superior ou que tenha uma embalagem caprichada. É bom lembrar que os norte-americanos repudiam veementemente a ideia de tributar alimentos porque isso é considerado um sacrilégio. O Amazonas é o estado que mais tributa alimentos. Somos um povo doente de tanto comer imposto.  

Como disse o deputado Carlos Hauly, de gambiarra em gambiarra chegamos ao caos tributário. O nosso sistema tributário é confuso, exatamente para sustentar um modelo perverso de injustiça tributária. Se tudo fosse claro e objetivo, toda a sociedade enxergaria as abominações escravizadoras dos mais pobres. No Brasil, 53% do bolo arrecadatório vem do consumo, enquanto nos EUA esse índice é de apenas 18%. Ou seja, o norte-americano ganha mais e pode consumir mais pelo fato de haver pouco imposto sobre consumo.


Por conta de tantos imbróglios é que todo papo de reforma tributária é conversa para boi dormir. Os especialistas e doutrinadores insistem em promover uma mudança de forma a perpetuar o nosso modelo regressivo. E o pior de tudo é que o ministro Paulo Guedes quer reduzir o imposto de renda, dando a entender que a velha cultura da esperteza continuará ditando as regras por muitas décadas ainda. Curta e siga @doutorimposto 























segunda-feira, 14 de novembro de 2016

PERVERSIDADE DOS REGIMES ESPECIAIS


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 15 / 11 / 2016 - A274

A crise financeira que assola as contas do Rio de Janeiro adquire contornos trágicos, com possibilidade dos servidores públicos ficarem sem salário nos últimos cinco meses de 2017. As medidas corretivas contemplam aumento de desconto previdenciário e majoração da alíquota do ICMS, que já é a maior do país. Ou seja, a população fluminense está sendo convidada a pagar o prejuízo causado por anos de desmando administrativo (como de praxe). O bode expiatório é sacrificado aos deuses enquanto o governo segue limpinho na sua gastança desenfreada. Meses atrás, o governador interino ficou numa saia justa por causa duma licitação de valor astronômico para bancar um rega-bofe escandaloso. Tudo foi cancelado porque a imprensa caiu de pau no assunto. A culpa oficial de tantos problemas está na queda de arrecadação, principalmente dos royalties. Mas também, vale ressaltar que cerca de R$ 200 bilhões foram sangrados do erário na forma de incentivos fiscais. Não fosse essa exacerbada política de regimes especiais o quadro geral do Rio de Janeiro estaria bem mais equilibrado.

A guerra fiscal joga as unidades federativas numa arena de disputas sangrentas, onde é impossível sair incólume. Alguém sempre paga o pato. Toda vez que se coloca mais dinheiro num bolso, o outro fica prejudicado. Quando um, ganha, o outro perde. (a matemática é insofismável). Mesmo assim, os regimes especiais são exaustivamente utilizados como política de desenvolvimento regional – não se trilha rotas alternativas ou não se sabe fazer outra coisa. O mexe remexe normativo para legalizar tantos solavancos tributários cria um buraco no orçamento, que é tapado pelo sacrifício dos mais fracos. O alvo preferencial é sempre o mais pobre, que já sofre horrores com o mais escarnecedor sistema regressivo do mundo. O rico não padece tanto porque quanto maior é a renda, menor é a carga relativa. Daí, o conceito da regressividade.

A progressividade no Brasil é um tabu difícil de quebrar porque o legislador se recusa a mexer no bolso do rico. Temos uma das menores taxações nominais sobre renda e patrimônio. Por exemplo, o governo francês abocanha 60% duma herança enquanto que o estado do Amazonas cobra 2% somente. Já, a cesta básica amazonense é a mais taxada do país. Isto é, todos os outros Estados possuem tributação reduzida para a cesta básica, menos o Amazonas. O pobre que se dane. Essa é a mensagem irradiada pelo poder público. Meses atrás, foi noticiado na internet que 45% dos rendimentos da família do ex-presidente Bill Clinton foram convertidos em impostos, enquanto que a nossa Lavagem Oficial da Repatriação foi beneficiada com alíquota de 15%. Por aqui, a sonegação de grande escala é premiada por leis boazinhas ou por reiterados programas de parcelamento, deixando o contribuinte honesto com cara de palhaço.

No paraíso da Zona Franca de Manaus vivem os empreendimentos geradores de empregos que, por tabela, alimentam uma infinidade de pequenos negócios. No frigir dos ovos, tudo gera renda e desenvolvimento. Mas, como não existe almoço grátis, alguém precisa suportar as agruras do inferno fiscal para manter o equilíbrio de forças. Aqui, percebe-se claramente uma brutal diferença entre dois polos econômicos: Indústria e Comércio. Enquanto o primeiro se comporta como um bebê chorão e mimado, o outro é tratado como bastardo. Os agentes governamentais formam uma blindagem em torno da ZFM, estando sempre de prontidão para embalar a criança. A Sefaz, por exemplo, atende imediatamente qualquer solicitação da FIEAM para discutir aspectos normativos ou procedimentos técnicos legais. Enquanto isso, o Conselho Regional de Contabilidade aguarda resposta para uma solicitação de esclarecimento protocolada dia 16 de janeiro de 2016. As insistentes cobranças de audiência não amoleceram o coração do órgão fazendário. Está pendente também um pleito acordado em reunião com o Governador para conferências mensais com a classe contábil das empresas comerciais. Toda essa marginalização acontece de modo grosseiro e ostensivo, quase um acinte.

A conta contábil Renúncias Fiscais não foi aberta ao TCE. A figura jurídica do Sigilo Fiscal é um instrumento utilizado para esconder o jogo de desigualdades e de injustiças tributárias. Tudo é feito para que institutos de pesquisas não consigam construir um panorama abrangente do sistema fiscal brasileiro. A ideia é que um não saiba o que o outro está ganhando. E tudo fica camuflado no pântano sombrio dos acordos de gabinete (feitos com os amigos do rei). Por outro lado, esse sistema perverso não é frontalmente combatido porque muita gente, lá no seu íntimo, quer mesmo é tirar proveito da situação. Cada um corre pra garantir o seu lado. O resultado está aí, na forma da tragédia fluminense, que pode ser o prenúncio duma onda a varrer o país inteiro. Quem sabe, talvez, lá debaixo dos escombros alguém possa enxergar o óbvio.









terça-feira, 4 de outubro de 2016

PODERIO TECNOLÓGICO NAS MÃOS DO FISCO


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 4 / 10 / 2016 - A268

Timothy Berners-Lee, criador da moderna internet (HTTP, HTML e WWW), declarou em 1999 que a web ideal era aquela onde os computadores seriam capazes de analisar o conteúdo e entender as transações entre pessoas e máquinas. Diversos experimentos tecnológicos atestam que a web semântica deixou o campo da ficção científica para se juntar a outras realidades ainda mais revolucionárias. Claro, obvio, o suprassumo de tantos avanços científicos é mantido sob o domínio das grandes potências mundiais. O trabalho pioneiro do buscador Wolfram Alpha inaugurou a categoria dos “mecanismos de conhecimento”, na medida em que buscou sistematizar o conhecimento humano. Fez isso com ajuda de linguistas e lexicógrafos munidos de dicionários que faziam correlações entre palavras e enquadramentos conceituais para dar sentido a expressões mais usadas na internet. O propósito era indexar tudo. Tudo, mesmo. Agora, imagine então uma coisa dessas nas mãos do Fisco. Pois é. Não precisa imaginar.

Uma recente publicação do Consultor Renato Matavelli alerta o contribuinte para o aperfeiçoamento dos mecanismos de controle fiscal, onde técnicos e auditores das secretarias de fazenda estão debruçados sobre estudos de alta performance para processamento de Big Data. Equipes altamente capacitadas estão trabalhando softwares de última geração para análise de dados via utilização de modelos estatísticos e todos os demais recursos necessários para implementação do projeto “Machine Learning”. Esse “Aprendizado de Máquina” trabalha os princípios da inteligência artificial abastecendo o sistema com regras e algoritmos de modo a capacitar o computador para tomar decisões baseadas na interpretação de um universo de dados ao invés de seguir uma programação objetiva. A tecnologia empregada nesse projeto permite que as máquinas aprendam e também melhorem suas análises com a exposição a novos fatos.

Um dos grandes objetivos do Sistema Público de Escrituração Digital (SPED) é justamente tornar mais célere a identificação de ilícitos tributários. Para tanto, as administrações fazendárias vêm trabalhando intensamente na racionalização do sistema tributário como um todo. O enrosco normativo ainda vigente no país é o empecilho maior aos projetos de inteligência fiscal. A Grande e insofismável estadista Margareth Tatcher disse certa vez que os paraísos fiscais existem por causa dos infernos fiscais. Por estranho que possa parecer, o nosso inferno fiscal acaba favorecendo a sonegação e outros crimes mais graves. A sobreposição exacerbada de normas conflituosas dificulta a sua transposição para sistemas lógicos e matemáticos. Daí que, desde a Emenda Constitucional 42, passando pelo primeiro Encontro Nacional de Administradores Tributários, na Bahia, e o colossal esforço em prol duma faxina normativa, o Fisco vem trabalhando intensamente na organização dum modelo que encontre ambiente propício ao advento definitivo da inteligência artificial.

Mesmo com tantos empecilhos burocráticos desfavoráveis ao trabalho dos técnicos fazendários, algumas experiências demonstraram eficácia animadora. Uma determinada secretaria de fazenda montou uma equipe formada por especialistas em informática, professores de linguística, estatísticos e tributaristas para desenvolver um modelo de análise que relaciona produtos com suas respectivas classificações fiscais. O objetivo era a identificação de inconsistências e fraudes no ICMS. A experiência apresentou alto grau de assertividade pela identificação de anormalidades relacionadas aos produtos estudados. Por exemplo, o refrigerante transportado em caminhão de 15mil litros era na verdade combustível.

A SEFAZ baiana está utilizando informações do Google Street View e também a identificação do IP de computadores no combate à sonegação. As operações ou atividades suspeitas são alvos dessa nova empreitada, que é denominada de “diligência remota”. Por exemplo, uma operação isenta, mas de grande volume destinada a uma pessoa física revelou que a mercadoria seguiu para um grande depósito de bebidas. Num outro caso de operação milionária o destinatário era uma casa simples da periferia, indicando assim uma ação altamente suspeita. Os técnicos fazendários estão vinculando os IP dos computadores que transmitem as notas fiscais eletrônicas ao endereço físico do estabelecimento, fato esse, que está ajudando e muito o trabalho de investigação e aplicação de autos de infração.





sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

CAIXA DE PANDORA TRIBUTÁRIA


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 19/01/2016 - A240

Não bastasse a convergência de tantas variáveis negativas a desestabilizar nossa economia, o governo escolheu o pior dos momentos para abrir sua caixa de pandora tributária. Isto é, todos os males confiscatórios desabaram na cabeça do contribuinte de uma só vez.

A explosão de escândalos combinada com a total perda de controle da gestão pública bagunçou o país por inteiro. Como resultado, várias conquistas obtidas nas últimas décadas viraram fumaça, com gente desempregada devolvendo imóveis financiados, inflação galopante, juros na estratosfera, investimentos paralisados e péssima imagem do Brasil no exterior. Até a pujante indústria da beleza experimentou sua primeira queda em vinte anos.

Pois é. Justamente nesse cenário sombrio e desolador cai uma tempestade de impostos. Vinte estados e o Distrito Federal promoveram aumento do ICMS, com o Amazonas despontando na frente com sua pesada carga sobre produtos essenciais à sobrevivência humana. Seguindo o ranking da opressão tributária, vem Maranhão, Paraíba, Rio Grande do Norte, Distrito Federal, Rio Grande do Sul e Rondônia. Outras unidades federativas tiveram o cuidado de não piorar a vida da população menos abastada, preferindo sobretaxar produtos supérfluos, como bebidas, cigarros, munições etc. O estado da Bahia poupou a cesta básica. Por outro lado, Rondônia tascou o bolso dos apreciadores de cerveja com 35% de alíquota nominal, o que consiste numa carga real perto dos 60% – só de ICMS. A cerveja ainda sofre pesadíssimas taxações de Pis, Cofins e IPI. É possível que o peso total se aproxime dos 100%, tal como acontece nos produtos de tabacaria. Tanto imposto diluído na bebida só vai piorar a ressaca do dia seguinte. A dor de cabeça não será privilégio dos pinguços, mas da população em geral, uma vez que tudo é repassado para o preço de bens e serviços, piorando o que já está ruim.

Alguns estados, como Acre, Espírito Santo, Mato Grosso, Pará, Santa Catarina e Roraima resolveram poupar o sofrido bolso do contribuinte não aumentando a carga do ICMS. Ocorreram diversas majorações Brasil afora, também, no IPVA, ITCMD, IPTU e ITBI. Imóveis de alto padrão, bem como veículos robustecidos de muitos cavalos foram especialmente catapultados para níveis mais altos de tributação. Poucas e modestas reduções tributárias aconteceram em algumas localidades, tais como redução de IPVA no Ceará, Santa Catarina e Rondônia. O ICMS ficou menos pesado para o álcool no Piauí e para medicamentos em São Paulo. A prefeitura de Recife criou um programa de incentivos fiscais com redução da alíquota do ITBI.

No âmbito federal, os equipamentos eletrônicos perderam alguns benefícios fiscais. O governo acabou com a isenção do imposto de renda sobre remessas pessoais ao exterior, como aquela relacionada a intercâmbio educacional – a taxação passou a ser de 25%. Interessante, é que o dinheiro repatriado do tráfico de drogas e da corrupção pagará somente 15% de imposto de renda. Ou seja, a educação do filho é punida enquanto que o crime é beneficiado. Isso é bem a cara de um governo inteiramente atolado na lama da corrupção.

A Receita Federal promoveu uma radical mudança no esquema de tributação das bebidas, o que elevou em muito a arrecadação de IPI. Operações geradoras de substanciais ganhos de capital serão fortemente impactadas pelo imposto de renda. A tão badalada operação de Juros Sobre Capital Próprio teve sua taxação majorada de 15% para 18% no IR fonte. Para fechar o pacote de maldades com chave de ouro, o governo acredita cegamente no retorno da CPMF.

Não custa lembrar que 2016 trouxe profundas e complexas mudanças na operacionalidade do ICMS vinculado às vendas interestaduais para não contribuinte do imposto. A coisa é tão confusa que ameaça destruir as pequenas empresas de comércio eletrônico. O obcecado apego que as nossas administrações tributárias tem pela exacerbação burocrática criou um troço tão maluco que poucos conseguirão digerir. São muitos detalhes e etapas a serem cumpridas para concretizar uma venda on-line. Os pesadíssimos custos burocráticos irão desafiar a capacidade de sobrevivência dos pequenos e dos grandes negócios. Parece que o governo vem testando a resistência do contribuinte, como se apertasse um parafuso contra um bloco de ferro maciço. 



quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

LAVAGEM OFICIAL


Doutor Imposto
Publicado no Jornal Maskate dia 17/12/2015 - A021

O trabalhador honesto sofre uma taxação do Imposto de Renda à alíquota 27,5%. A multa por atraso pode chegar a 20% do imposto devido mais 14% de taxa Selic. Resumindo, O trabalhador honesto sofre uma penalidade por sonegação que gira em torno de 37% do rendimento não declarado. Isso, sem contar com o fato de que o governo não permite o abatimento integral de despesas essenciais, como por exemplo, gastos com educação.

Foi aprovado no Plenário do Senado federal nesta terça-feira (15), o projeto que regulariza recursos financeiros mantidos no exterior e não informados à Receita Federal (PLC 186/2015). Para entrar em vigor o projeto dependerá da aprovação da presidência da república. Dessa forma, os brasileiros poderão incluir nas suas respectivas declarações de imposto de renda os recursos ilegais mantidos no exterior, bastando, para isso, pagar uma taxa de 15% mais 15% de multa. Assim, o detentor de dez milhões escondidos na Suíça terá seu dinheiro ilegal lavado pelo próprio governo, sobrando mais de oito milhões limpinhos da silva.

Mais uma vez o governo vem reforçar a tese de que não vale a pena ser honesto no Brasil. As pessoas que costumam pagar seus impostos em dia vivem engolindo um festival de anistias ao vizinho sonegador. Só que agora, o governo resolveu também anistiar doleiros, traficantes, corruptos e criminosos de todos os naipes. Claro, óbvio, que, oficialmente, tais detalhes incômodos não estão explicitados no texto legal. Mas, como estamos carecas de saber, uma coisa se esconde atrás da outra. E no meio das camuflagens e do consagrado jeitinho as coisas vão se misturar dum jeito que no final das contas tudo vai ser lavado, já que a porteira foi aberta. Por exemplo, o senador Cássio Cunha Lima disse que esse projeto de repatriação abre um “precedente gravíssimo”. Outros parlamentares classificaram a proposta como “imoral” e “coisa de bandido”, por incluir a possibilidade de anistiar crimes de descaminho, falsificação de documento público e facilitação da lavagem de dinheiro.

Ao criticar a proposta, a senadora Simone Tebet expressou sua indignação ao tratamento especial concedido aos sonegadores em relação ao cidadão que paga seus impostos em dia. Ela ainda criticou a possibilidade de anistia para crimes graves, uma vez que serão anistiados os crimes de sonegação fiscal e evasão de divisas, além de lavagem de dinheiro, descaminho, uso de documento falso, associação criminosa, contabilidade paralela, falsa identidade e funcionamento irregular de instituição financeira. Para facilitar ainda mais a vida do sonegador, os valores repatriados serão convertidos pela cotação do dólar de 31 de dezembro de 2014 (R$ 2,65).

Pois é. Bandidos e sonegadores de todos os calibres estão sorrindo para as paredes, uma vez que o próprio governo está facilitando operações de lavagem de dinheiro que poderiam ser arriscadas e onerosas. Já, o cidadão honesto vai ter que engolir mais essa. O trabalhador extorquido pelo fisco que pagou 37% de encargos para regularizar seu imposto de renda vai assistir de camarote ao bandido pagar 17% para regularizar o dinheiro oriundo da corrupção e do tráfico de drogas.