Publicado no Jornal do Commercio em 18/04/2012
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No estado de direito prevalece o chamado “império da lei”. Isso significa que as leis criadas pelo Estado limitam as ações das pessoas físicas e das pessoas jurídicas. Limitam também o próprio poder estatal, evitando-se assim o absolutismo arbitrário. Os estados ocidentais modernos aplicam a teoria da separação dos poderes de Montesquieu entre executivo, legislativo e judiciário, justamente para coibir abusos e propiciar um ambiente de equilíbrio legal e de exercício efetivo da cidadania. Todo esse instrumental teórico se opõe ao dito “direito divino” e à tentação de impor vontades ou opiniões surgidas de momento; tudo isso para evitar posturas semelhantes ao do rei Luís XIV e a sua célebre frase “O Estado sou eu”.
O
espírito do rei Luís XIV costuma se apossar do corpo de muita gente. É possível
que seja a entidade espiritual com maior número de downloads. Basta refletir um
pouco sobre a nossa realidade cotidiana para constatar o grande número de “Luis
XIV” que nos deparamos em órgãos públicos como Sefaz, Receita Federal,
Prefeitura, Suframa, Junta Comercial etc. Todos esses “Luís XIV” são tentados a
colocar a legislação de lado e impor a sua opinião particular quando são
consultados ou quando analisam processos. A própria estrutura da legislação
tributária foi propositadamente construída para evitar que a lógica seja
prevalecida. E todo novo dispositivo legal publicado nos diários oficiais estará
sempre contaminado pelo germe alucinado da complexidade desmedida. Claro, o objetivo
do legislador é sempre evitar ao máximo que se encontre objetividade nas suas
palavras, para que assim os “Luís XIV” possam ter espaço para pintar, bordar e
tripudiar sobre o contribuinte.
Os
órgãos estatais de controle costumam empurrar goela abaixo do contribuinte
algumas normas que contrariam legislações superiores e por incrível que pareça,
até normas que o próprio órgão cria. Um bom exemplo tem a ver com o ICMS dos
bens de informática. A alínea “d”, do Inciso I, do artigo 12, do Decreto estadual
20.686/1999 estabelece tacitamente alíquota interna de sete por cento para bens
de informática, assim definidos na LEGISLAÇÃO FEDERAL DE REGÊNCIA. A dita cuja
legislação federal de regência é o Decreto 7.010/2009, cujo Anexo I determina o
que é bem de informática através de uma lista de produtos com seus respectivos códigos
NCM. Dessa forma, a SEFAZ sabe muitíssimo bem quais produtos são considerados
bem de informática e mesmo assim, trata todos eles como se não fossem. O erário
estadual nega o benefício do artigo 12 aos contribuintes quando aplica alíquota
interna de 17% aos bens de informática nas notificações de antecipação de ICMS.
Esse procedimento obriga o contribuinte a constituir um processo de solicitação
de revisão de notificação para que o cálculo do imposto fique de acordo com a
legislação estadual. Esse processo é composto por um calhamaço de cópias de uma
infinidade de documentos. O pacotão de papelada é dado entrada no setor de
revisão de notificação, onde pode ficar lá por anos a fio sem resposta, visto
não existir prazo na Resolução GSEFAZ 24/2010, a qual disciplina o processo de
revisão dessas notificações, significando assim que tais processos podem
demorar décadas para serem analisados. Não à toa, esses ditos processos que
aguardam análise se avolumam e já estão na casa das dezenas de milhares. Enquanto
isso, o contribuinte continua mensalmente preparando vários processos de
revisão de notificação e vendo seu volume de imposto pendente de decisão
crescer exponencialmente. Para piorar esse quadro nefasto, o contribuinte é
alvo do terrorismo dos fiscais que ficam permanentemente fazendo comentários
sobre o risco de indeferimento dos processos.
Até
pouco tempo atrás, a SEFAZ, meio que em doses homeopáticas, estava deferindo os
pedidos de revisão de notificação dos bens de informática via acatamento da
argumentação baseada no Decreto 7.010/2009. De um momento para o outro, deixou
de considerar o Decreto 7.010/2009 como instrumento classificador de bens de
informática e passou a adotar uma lista de produtos constantes no Anexo I, da
lei estadual 23.994/2003. Essa atitude da SEFAZ afronta brutalmente a
supracitada alínea “d”, do Inciso I, do artigo 12, do Decreto estadual
20.686/1999, que estabelece tacitamente alíquota interna de sete por cento para
bens de informática, assim definidos na legislação FEDERAL de regência. Ou
seja, É FEDERAL. NÃO É ESTADUAL. A regra está lá na legislação que a própria
SEFAZ criou e que agora não está obedecendo. Onde nós estamos? Cadê o
Ministério Público? Cadê o governador? Cadê os defensores do Estado de Direito?
O que resta ao contribuinte fazer quando o órgão público atropela tudo quanto é
lei e resolve fazer o que der na telha?
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