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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 30/12/2014 - A196
O
pai traficante soube que o filho foi preso por furtar as economias do tio
estelionatário. A mãe ficou desesperada com a notícia e por isso deixou sua
clínica de aborto clandestino às pressas para se dirigir à casa de detenção.
Chegando ao local da prisão o traficante descobriu que seu primo, dono de um
desmanche de carros roubados também teve seu dinheiro subtraído pelo famigerado
larápio. Mesmo diante de tanto nervosismo o sangue frio do pai foi suficiente
para administrar a situação. Conversa daqui, conversa dali, muito papo ao pé do
ouvido e, daqui a pouco o filhinho querido acabou sendo liberado sem maiores
complicações. Tal desfecho só foi possível porque tanto o delegado quanto os
demais policiais recebiam uma mesada semanal dos chefões da comunidade onde
ocorreu o flagrante da prisão. Resolvida essa primeira parte do problema, a
bronca agora era com os tio e primo do meliante. O pai, macaco velho, se valeu
de todo seu estoque de astúcia para engabelar os otários, fazendo isso de tal
forma que as tensões foram arrefecidas e os ânimos apaziguados: Argumentou que
os jovens eram impulsivos, inconsequentes etc. Afinal de contas, quem já não cometeu
a mesma tolice? Também, ali, todos tinham pecados bem maiores. E, de certa
forma, estava tudo em família.
O
ano de 2014 foi profundamente marcado pelo escândalo Petrobras – mais um dentre
tantos que permanentemente vem manchando a já esculachada imagem do Brasil, o
qual está pessimamente posicionado na escala internacional da corrupção. Trocando
em miúdos, vivemos na terra da bandidagem institucionalizada. Só que dessa vez
a coisa extrapolou todos os limites do razoável, revelando-se uma
monstruosidade sem tamanho. Os números da roubalheira são simplesmente
espantosos. Parece que os eventos criminosos resolveram se estabelecer na casa
dos bilhões. Outro fato assustador revelado pela Polícia Federal tem a ver com
a voracidade dos investigados que demonstraram uma ganância incomensurável.
Dessa vez os corruptos não pouparam esforços para ir fundo, mas bem fundo na
bandidagem. Como o alvo dos ataques é uma empresa que movimenta cifras astronômicas,
naturalmente, o volume de atos criminosos foi além da estratosfera. E o mais impressionante
desse enredo sujo é o fantástico arsenal de provas, documentos e depoimentos repleto
de detalhes.
O
caso Petrobras escancarou um problema mais amplo e muito mais profundo dos que
os bilhões de reais vinculados à operação Lava-Jato. O delator do esquema e
ex-diretor de abastecimento Paulo Roberto Costa, disse em audiência pública que
“o que acontecia na Petrobras acontece no Brasil inteiro: nas rodovias, nas
ferrovias, nos portos, nos aeroportos, nas hidrelétricas! É só pesquisar”. Ou
seja, a roubalheira sistêmica é de uma magnitude inimaginável. A próxima onda
tsunâmica a varrer o país, tudo indica, virá com a etiqueta BNDES. Só que dessa
vez não mais se falará em bilhão e sim, em meio trilhão de reais. Atingiremos
outro patamar na escala da corrupção. Isso, se as obras públicas não forem
investigadas. Se o Juiz Sérgio Moro resolver mexer na podridão das obras
públicas, aí, sim, seremos catapultados para a casa dos trilhões de reais
roubados dos pesadíssimos impostos cobrados por um governo apinhado de bandidos.
E
o que faz o governo diante desse estado calamitoso? Age com a maior
naturalidade do mundo. O que faz as criaturas do congresso? Vale-se do momento
para tirar proveito da situação com ardilosas negociatas. No legislativo, todo
acontecimento é sempre visto como oportunidade de fortalecer posições partidárias.
Tudo é muito elástico, maleável, negociável, contornável. Tudo que importa é o
poder. Questões éticas fazem parte do lúdico mundo dos discursos; não, da vida
prática. O discurso é a interface entre o político e o povo. Lá, dentro, no
íntimo, entre os políticos, o discurso é puro teatro. E lá, mais intimamente,
na calada da noite, a conversa é outra, o esquema é outro – bem diferente dos clichês
proferidos na televisão.
A
expectativa do governo e da politicada em geral é que o assunto Petrobras, aos
poucos, vá sendo contornado, vá sendo contemporizado, vá sendo esquecido e se
acomodando para daqui a pouco tudo voltar “ao normal”. Afinal de contas, tá
tudo em família. Os políticos barulhentos vão sendo acalmados com propinas. O
Judiciário, esse é comandado por controle remoto; só faz o que o Executivo
manda. Até mesmo, porque o encrenqueiro Joaquim Barbosa não está mais lá para
atrapalhar os esquemas. Então, é só deixar que o tempo cuide do resto. Quanto
ao povo, o povo está totalmente alienado – acha que corrupção é coisa natural
da política. Só tem um problema. E sério. O sistema judicial americano não
tolera corrupção nem bandidagem empresarial que cause prejuízos aos
investidores. Os fundos ianques que aplicaram dinheiro em ações da Petrobras
querem ser ressarcidos por prejuízos decorrentes dos escândalos que derrubaram
a cotação na bolsa de valores. Isso pode ter um perigoso efeito dominó e piorar
ainda mais a tensão com a firma de auditoria PricewaterhouseCoopers, que se
recusa a aprovar o balanço da companhia.
Pois
é. Lá fora é lá fora. Não tem como subornar os juízes nem as leis americanas.
Que pena. Aqui, é tão fácil comprar tudo e a todos..!!
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