Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 24 / 12 / 2019 - A385
Quando
a empresa desconta imposto de renda do empregado ou efetua retenções
tributárias de um prestador de serviços, ela deve repassar os valores ao erário.
Ponto final. O mesmo acontece com o substituto tributário do ICMS que
acrescenta o imposto ao total da nota fiscal. Nesses casos, a empresa opera
como um simples entreposto (contribuinte de direito); sua função é conectar o Fisco
ao “contribuinte de fato”. Os recursos em questão passam ao largo das atividades
operacionais e por tal motivo o não recolhimento fica indiscutivelmente
caracterizado como crime de apropriação indébita. Assim deveria acontecer com
qualquer tipo de tributo indireto, o que reduziria drasticamente a sonegação
fiscal.
ICMS,
Pis e Cofins, teoricamente, são tributos retidos do comprador e posteriormente
repassados ao erário. Teoricamente. Na prática, a coisa toda é muito complicada.
Esse trio parada-dura não é retido no momento da venda nem calculado sobre o
valor da mercadoria, mas os três são trabalhados como elementos formadores do
preço, que é base de tudo. Sobre o preço final se aplica a alíquota do ICMS;
também, do Pis e da Cofins, fazendo com que suas cargas efetivas fiquem muito
acima daquilo que consta nas respectivas normatizações legais. Acontece que, muito
raramente, esse arranjo metodológico é adotado na sua plenitude, porque o
mercado impõe uma conduta estabelecida pelos sonegadores. Por exemplo, um grande
distribuidor de bebidas manauara faliu porque insistiu na aplicação dessa dita
metodologia. Consequentemente, seus preços ficaram muito acima da concorrência,
que não fazia a mesma coisa.
Os
preços constantes em meio mundo de produtos espalhados por inúmeras empresas
não carregam completamente os percentuais de ICMS, Pis e Cofins ditados pela
legislação, mas os documentos fiscais atestam legalmente que a retenção foi efetivada,
o que contraria a realidade dos fatos. Isso significa que, por exemplo, o
percentual de 18% destacado na nota fiscal nem sempre é retirado do bolso do
cliente. O problema é que a emissão da nota está amarrada à presunção legal da
retenção; uma coisa é indissociável da outra. Com isso, a Sefaz se dá o direito
de utilizar a força policial para invadir o estabelecimento, prender o
contribuinte e pilhar o seu patrimônio. Para evitar toda essa tragédia grega, o
vendedor deve repassar ao Fisco aquilo que não foi retido, fazendo com que os
custos fiquem bem acima da receita. Nesse caso, o agente fazendário não resgata
um valor retido do comprador e sim, arranca um pedaço do patrimônio da empresa.
O ICMS, portanto, deixa de ser um tributo sobre consumo e passa a ser um
imposto sobre patrimônio; uma espécie de IPTU do estoque.
O
sistema de impostos “por dentro” é um jogo diabólico, onde as empresas são
pressionadas, de um lado, pela Sefaz e do outro, pelo mercado. A dupla Sefaz/RFB
não dispõe de estrutura mínima suficiente para garantir que os tributos sejam
corretamente embutidos nos valores das mercadorias. Mesmo porque, não há como
tornar público a formação de preços. Até mesmo grandes distribuidoras se veem
obrigadas a fazer promoções agressivas de mercadorias com validade curta, o que
desmantela totalmente a idealizada formação de preço. Tais perversidades escarnecedoras
de mercado, teoricamente, não acontecem no setor de combustíveis porque a
tributação da venda final ocorre na refinaria, obrigando todo mundo a pagar a
mesma carga tributária. O regime do ICMS substituição tributária, apesar de
polêmico, tem o pendor de uniformizar as condições de concorrência.
Diante
dum imbróglio extremamente enroscado no cipoal de normas conflituosas, fica
impossível criminalizar o inadimplemento do recolhimento do ICMS declarado. Em
face dum suposto inquérito policial, a prova cabal de apropriação indébita não
se daria pela simples declaração impressa na nota fiscal e sim, pela comparação
dos custos com a venda efetivada.
Vigorou
no estado do Acre até 2015 um excepcional sistema de cobrança de ICMS que prevenia
distorções de concorrência: Todas as mercadorias ingressadas no território acreano
pagavam ICMS substituição tributária, o que deixava o mercado livre para trabalhar
sem aporrinhações fiscais estaduais. Tudo ficava perfeito quando Pis Cofins
eram monofásicos ou isentos.
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