Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 16 / 12 / 2021 - A437
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A
modalidade ICMS substituição tributária se justifica pela dificuldade de
fiscalização sobre produtos vendidos em larga escala e por muitos contribuintes,
como, por exemplo, medicamentos, bebidas, combustíveis etc. Esse argumento do
agente fazendário caiu por terra quando os estados despejaram uma enormidade de
produtos nesse sistema arrecadatório. Todo um cuidado inicial envolvendo pesquisa
de preço também se desmantelou completamente pelo chafurdo difuso das margens
de valor agregado. A Sefaz insiste na tese da legitimidade dos percentuais de
MVA, mas sabemos todos nós que o esquema é totalmente furado. A coisa vai dum
extremo ao outro sem nenhum compromisso com a realidade. Por exemplo, a MVA do
leite é de 15% e da cerveja é de 120%. Em qualquer formação de preço o
comerciante deve considerar, no mínimo, custo operacional, impostos e margem de
lucro. E, obviamente, que 15% tá longe dessa ponderação. Por outro lado, nenhum
supermercado vende cerveja com 120% de agregação. Pode ser que a Sefaz tenha
encontrado essa MVA na Rua Lobo D'Almada,
próximo da José Clemente.
Conclui-se assim, que a política de MVA não tem nada a ver com preços praticados
pelos comerciantes.
Não bastasse a existência de uma substituição tributária sem substituto (ST interna), a Sefaz e suas colegas de outras UF criaram a MVA ajustada. Para completar o pacote de insanidades, outra confusão normativa perturba esse terreno movediço: Trata-se do entrelaçamento quântico envolvendo tintas, pneumáticos e veículos, os quais estão sujeitos às normas de substituição tributária interna (Resoluções 40 e 36) e ao mesmo tempo também estão sujeitas às normas de substituição tributária interestaduais (Convênios 74, 85, 102 e 110); a diferença está na grande distância monetária. Se mergulharmos mais fundo nessa questão, iremos constatar que o Decreto 38.910 acabou com o ajustamento de MVA no Amazonas. Sendo assim, esse mecanismo de extremada majoração fiscal não deveria ser aplicado a nenhuma mercadoria ingressada no Amazonas. Mais do que uma tese abstracionista, um grande comerciante manauara fez valer, na Justiça, essa constatação, contrariando seus concorrentes que continuam pagando mais caro.
A responsabilidade pelo ICMS-ST interno é do comerciante que traz a mercadoria de outras UF (artigo 110, V; artigo 120, II RICMS/AM). A exceção ocorre nas filiais atacadistas de matriz sediada fora do Amazonas e também quando existe relação de interdependência. Nesses dois casos, a responsabilidade do ICMS-ST recai sobre os clientes amazonenses dessas empresas (Clausula nona, II, §1, Convênio 142/2018).
Pois bem. Como desgraça pouca é bobagem, no dia último dia 3 a Distribuidora Centilênia comprou leite do Atacadista New Age, onde foi imediatamente constatada a tributação normal de um produto ST (CST 000; CFOP 5102). O adquirente estranhou o enquadramento e assim contactou seu fornecedor, que informou possuir um regime especial para não mais pagar ST sobre alguns produtos; disse ainda que a Distribuidora deveria continuar tratando o leite como se o imposto definitivo estivesse sido pago (o que não foi). Desse modo, a Distribuidora se deparou com o dilema de tributar com ICMS zero (ST) ou então tributar normalmente ao revender o leite. As duas alternativas eram arriscadas.
A Distribuidora foi até o Departamento de Tributação da Sefaz, onde recebeu ordem de pagar o ICMS-ST no lugar do Atacadista. Ou seja, a Sefaz fez, ali mesmo, uma transmissão de responsabilidade sem base legal alguma. E também se recusou a justificar legalmente essa ordem. Obviamente, não fez isso porque não existe normatização relacionado a essa situação peculiar. Eu, Reginaldo, contactei o setor de substituição tributária da Sefaz, que respondeu dizendo que, na dispensa legal da responsabilidade do contribuinte original, o próximo da cadeia assume o encargo do fornecedor. Acredito que, provavelmente, a Sefaz esteja desorientada com tudo isso. E, talvez, preocupada com a arrecadação, mas também com a observância legal, tenha agido por impulso técnico. Na verdade, é possível que a Sefaz seja tão vítima dessa situação embaraçosa quanto a Distribuidora, já que, provavelmente, o dito regime especial tenha sido consequência de um Mandado de Segurança, o qual pode ser derrubado por instâncias superiores.
Seguindo a orientação do Detri (Sefaz), a Distribuidora pagou o ICMS-ST no lugar do Atacadista. Na opinião de um renomado especialista tributário, essa Distribuidora não deveria pagar nada de ST; deveria, sim, continuar tratando o produto com ICMS zero na revenda. Mas também não poderia aproveitar o crédito destacado na nota fiscal, porque, se o Mandado de Segurança cair, o Atacadista pode ser obrigado a voltar atrás e pagar tudo com acréscimos moratórios. Se essa possibilidade se concretizar, o ICMS-ST seria pago duas vezes, restando à Distribuidora pedir restituição.
O regime especial obtido pelo Atacadista bagunça um sistema já esculhambado por transformar seus clientes em potenciais criminosos, já que, pela opinião autoritária do Detri, os adquirentes passaram automaticamente a ser responsáveis legais pelo recolhimento, mesmo sem amparo legal nenhum. A pergunta que fica é a seguinte: A Sefaz vai colocar um batalhão de fiscais para visitar todos os clientes do Atacadista? A Sefaz vai punir todo mundo por não recolher um imposto indevido? Será que todos os clientes do Atacadista tiveram o cuidado de analisar a nota fiscal como fez a Distribuidora?
O fato é o seguinte: A coisa é bagunçada ao extremo e, por mais desvairado que seja, o ICMS substituição tributária pode gerar loucuras novas e perturbadoras. E, não bastasse a Sefaz ficar dia e noite debruçada em regulamentações confusas, o nosso sistema judicial costuma jogar titica no ventilador para deixar tudo mais cáustico e sufocante. Conclui-se então que o Brasil é um país condenado ao eterno fracasso, se o povo trabalhador continuar refém da psicopatia dos agentes públicos. Curta e siga @doutorimposto.
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