Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 14 / 6 / 2022 - A453
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Menos
de dois anos de pandemia fizeram o Brasil retroceder três décadas em termos de
segurança alimentar. No fim de 2020, 19,1 milhões de pessoas conviviam com a
fome no país. Em 2022, são 33,1 milhões de pessoas sem ter o que comer, como
mostra a atualização dos dados do Inquérito Nacional Sobre Insegurança
Alimentar, desenvolvido pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e
Segurança Alimentar (Rede PENSSAN). Enquanto a fome cresce de forma exponencial
e o país volta aos patamares da década de 1990, a força solidária que se formou
na pandemia perde força e vemos o tema sair da agenda das grandes empresas – Uol
<bit.ly/3OsJ0iL>.
Embutidos nos alimentos que consumimos estão ICMS, PIS, COFINS e IPI, cujas taxações são assustadoramente vergonhosas. Mais do que isso, a coisa toda é diabólica por conta do tal mecanismo de “imposto por dentro”, onde todos os elementos do preço de venda são base dos tributos, incluindo os próprios tributos. Percebe-se claramente a relação direta do crescimento da fome com o aumento de impostos nos últimos anos.
Suponhamos que a partir do custo de aquisição (R$ 100,00) a empresa acrescente 20% de gastos operacionais (R$ 28,57) mais 10% de lucro antes do IRPJ (R$ 14,29) que são calculados sobre o preço de venda antes dos tributos (R$ 142,86). E que sobre R$ 142,86 seja calculado 18% de ICMS (R$ 25,71) mais 7,6% de COFINS (R$ 10,86) mais 1,65% de PIS (R$ 2,36) totalizando assim o preço final de R$ 181,79. Seria esse, o sistema de “tributação por fora” que é aplicado somente ao IPI. Mas, infelizmente, ICMS, PIS e COFINS são “tributos por dentro”. Mesmo porque, o RICMS/AM diz que integra a base do imposto, o montante do próprio imposto (Art.13, §1, I).
A metodologia de cálculo exigida pela dupla Sefaz/RFB é da seguinte forma: Custo de aquisição R$ 100,00 mais gastos operacionais R$ 46,78 mais lucro bruto R$ 23,39 mais ICMS R$ 42,11 mais PIS R$ 3,86 mais COFINS R$ 17,78 resultam no preço de venda R$ 233,92. A diferença absurda da carga tributária desses modelos está no tal “imposto por dentro”. Observe que o ICMS pula de R$ 25,71 para R$ 42,11. Consequentemente, a carga real vai muito além das alíquotas nominais quando se separa produto de imposto. Sempre mostro para meus alunos um quadro que ilustra uma compra de mercadoria R$ 100,00 quando ICMS R$ 18,00 PIS R$ 1,65 COFINS R$ 7,60 são recuperáveis. Qualquer contador sabe que vai para o estoque somente R$ 72,75 (valor sem esses tributos). Se fizermos uma relação percentual entre o que é estocado e suas respectivas taxações, iremos descobrir que a carga real é: ICMS 24,74%, PIS 2,27% e COFINS 10,45%. Tal mixórdia fica ainda mais cabeluda quando todo esse processo acontece na venda de insumo para a indústria, na venda da indústria para o atacadista e depois na venda do atacadista para o varejista e posteriormente na venda do varejista para o consumidor. Por isso é que 72% do videogame é puro imposto. E por isso é que os bens de consumo são muito muuuito caros (incluindo alimentos).
Nos EUA nenhum tipo de alimento paga imposto porque isso é considerado um sacrilégio por ser um vetor da fome. O Estado Americano não quer carregar o fardo de milhões de mortes advindas da insegurança alimentar. Mas aqui, no Brasil, a dupla Sefaz/RFB baixa o cacete na cobrança impiedosa de taxas altíssimas sobre alimentos básicos. Por exemplo, o governador Wilson Lima revogou a isenção do ovo de galinha, prevista no Convênio 44 de 1975 via Decreto 43.182, que saiu de 0% para 18%. Lembro bem que exatamente no mês de início dessa cobrança diabólica a cartela pulou de R$ 10,00 para R$ 15,00. Inclusive, na época, somente o governador do Amazonas teve a audácia de fazer uma presepada dessa. O mesmo Wilson Lima é responsável pela maior taxação ICMS da cesta básica entre todos as unidades da federação. Por aqui, produtos da cesta básica pagam 18% ICMS, mas o mesmo governador cobra 12% de um automóvel tipo Mercedes, Audi ou Porsche, contrariando frontalmente o princípio da seletividade (CF, Art. 155, § 2º, inciso III).
A pesadíssima tributação dos alimentos é mais que uma vergonha nacional, é um crime que mata milhares de pessoas de fome. Não fosse tantos impostos, o brasileiro poderia comprar o dobro de alimentos pelo mesmo valor que paga atualmente. Os responsáveis por esse genocídio institucionalizado nas legislações tributárias deveriam ser levados a um tribunal internacional. Eis alguns exemplos de cobranças absurdas: Refrigerante paga 3,50% de Pis mais 16,65% de Cofins <bit.ly/39noSQ1>; Extratos concentrados de guaraná ou açaí pagam 50% de IPI <bit.ly/3zEg03n>. Por isso é que o IBPT aponta a carga de 40,96% sobre o Catchup <bit.ly/2M48cAy>. Curta e siga @doutorimposto.
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