Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 03/09/2013 - A136
O
benefício tributário da desoneração da folha de pagamento, tão alardeado pelo
governo no final do ano passado e tão almejado pelo comércio foi duplamente
atropelado pela inércia do executivo federal. Primeiramente, a Medida
Provisória 601/2012 perdeu sua validade em 03/06/2013 através do Ato
Declaratório 36/2013, do Congresso Nacional. Essa dita MP havia incluído os
setores do comércio e da construção civil no regime substitutivo da desoneração
da folha de pagamento a partir da competência abril/2013. Ou seja, já no início
de junho as empresas enquadradas foram jogadas numa espécie de limbo fiscal,
onde ficaram aguardando o trem seguir em frente ou retornar ao ponto de
partida. Para corrigir a pisada de bola e garantir o compromisso firmado com os
setores beneficiados o governo acionou seus magos, que num ritual de alquimia
jurídica inocularam o espírito da MP 601/2012 no procedimento que converteu a
MP 610/2013 na Lei 12.844/2013.
O
Senado aprovou a MP 610 dia 11/07/2013, restando a presidente Dilma sua sanção
como última etapa da alquimia jurídica. Dessa vez, e novamente, o governo, além
de pisar na bola, tropeçou nas próprias pernas promovendo assim uma lambança
digna de destaque nos anais da república.
A
Lei 12.844/2013 incluiu o parágrafo 8º no artigo 8º da Lei 12.546/2011, que é a
Lei Mãe da desoneração da folha de pagamento. O supracitado parágrafo 8º
permitia que as empresas interessadas pudessem continuar desoneradas a partir de
junho de 2013, visto que a Lei 12.844 estabeleceu a competência novembro desse
ano como nova data de enquadramento obrigatório no regime substitutivo da
desoneração da folha de pagamento.
O
problema é que a Lei 12.844/2013 incluiu também o parágrafo 9º no artigo 8º da
Lei 12.546/2011, que condicionou a opção de continuidade do enquadramento ao
recolhimento da contribuição substitutiva no prazo de vencimento. Dessa forma,
quem quisesse continuar desonerado deveria ter feito o recolhimento da
competência junho/2013 na modalidade substitutiva até o prazo de vencimento,
que foi dia 19/07/2013.
A
Lei 12.844/2013 foi publicada na edição extra do Diário Oficial no final do dia
19/07/2013. Ou seja, só no final desse dia as empresas foram oficialmente
informadas que deveriam ter feito a opção nessa data. O problema é que não foi
possível fazer essa dita opção porque o expediente bancário já estava encerrado
e praticamente todo mundo havia pagado o INSS patronal com base na folha de
salários. Como a própria lei diz que a opção deveria ter sido feita de forma
irretratável, a consequência imediata foi a criação de um vácuo entre maio e
novembro de 2013. Essa lambança beneficiou as empresas prejudicadas pelo
regime, que ficarão cinco meses fazendo o recolhimento patronal de 20% sobre a
folha de salários enquanto as beneficiadas pelo regime que tiveram redução de
INSS em abril e maio ficaram obrigadas a pagar mais nos cinco meses subsequentes.
O
rebuliço provocado pela morte da MP 601/2012 voltou como uma assombração a
infernizar a vida das empresas quando a Lei 12.844 permitiu e instantaneamente
proibiu a continuidade no regime substitutivo da desoneração da folha de
pagamento. A coisa foi tão surreal que muitos contadores ficaram a ver e rever
várias vezes a regra legal até que o Ato Declaratório Interpretativo 04 da
Receita Federal, de 27/08/2013, confirmou a existência desse vácuo entre maio e
novembro de 2013. Ou seja, como é possível o governo conceder um benefício
fiscal já invalidado? É a mesma coisa que presentear o agricultor com sementes
mortas.
A
consequência desse imbróglio é que muita gente simplesmente ignorou o tal do
parágrafo 9º ao retificar o recolhimento da competência junho para o regime
previdenciário substitutivo. Outras empresas consultaram seus departamentos
jurídicos para conferir sustentação legal às suas decisões. Alguns até dizem
que o governo não teria a cara de pau de punir as empresas que deram
prosseguimento ao regime da desoneração da folha de pagamento por causa do
absurdo legal do parágrafo 9º. O certo é que esse assunto deu muito pano para
mangas, evidência mais do que gritante da incompetência de um governo que
possui, talvez, a estrutura administrativa mais cara do planeta e que por isso
mesmo não poderia cometer tantos deslizes.
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