Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 24/09/2013 - A139
Não
existe algo mais achincalhado e mais perseguido pela Receita Federal do que a
escrituração contábil das empresas. A contabilidade é o mais importante e
eficaz instrumento de controle dos fenômenos patrimoniais; sua adequada
utilização pelos comandantes de diversas entidades foi seriamente prejudicada
pela intransigência do fisco federal que, na prática, manteve essa
contabilidade acorrentada no calabouço insalubre do Regulamento do Imposto de Renda.
Não se sabe exatamente a data e hora do sequestro. Sabe-se somente que depois
de décadas encarcerada no charco da burocracia oficial, a contabilidade foi
finalmente libertada em dezembro de 2007 pela Lei 11.638. A coitada estava tão
maltrapilha e tão desfigurada que mesmo depois de tanto tempo, ainda não
conseguiu se recompor. Esses últimos anos têm sido marcados pela intensa
dedicação de muita gente que se debruçou na reinterpretação da técnica
contábil. As empresas fizeram altos investimentos, tanto na modificação de
alguns processos operacionais quanto na capacitação dos seus empregados. Do
lado de fora da empresa, no ambiente acadêmico, o vasto e absoluto contingente
de professores e de alunos foi transportado para um terreno conceitual inteiramente
distanciado do anacronismo contábil sepultado no final de 2007. De lá para cá a
Receita Federal vinha demonstrando uma postura de neutralidade para não
atrapalhar o processo de adoção das IFRS.
Para
surpresa geral e espanto da classe contabilista, a Receita Federal ressuscitou
o padrão contábil que jazia no cemitério do tecnicismo fiscal. A Instrução
Normativa 1.397, publicada na semana passada (17/09/2013), mudou radicalmente o
sadio rumo que as empresas vinham tomando para o contínuo aperfeiçoamento da
qualidade das suas informações econômicas e financeiras. Essa nova obrigação
legal simplesmente promove um sério, confuso e oneroso retrocesso técnico ao
instituir a tal da Escrituração Contábil para fins Fiscais (ECF). A partir do
próximo ano as empresas serão obrigadas a fazer duas escriturações contábeis. Uma,
para as chamadas “partes interessadas” ou “stakeholders” (acionistas, bancos,
fornecedores etc.), e outra, exclusivamente para o fisco federal. Até o final
desse ano, o instrumento utilizado para cumprir as determinações da Receita
Federal de modo a não comprometer o processo de convergência às normas
internacionais de contabilidade (IFRS) é o Regime Tributário de Transição
(RTT), instituído pela MP 449/2008, que posteriormente foi convertida na Lei
11.941/2009.
O
aspecto mais polêmico e preocupante da IN 1397 está relacionado ao tratamento
tributário do lucro e dos juros sobre capital próprio (JCP), que obedecerá às
regras vigentes até 2007. O perigo reside no fato dos fiscais da Receita
Federal se sentirem no direito de aplicar essa nova regra às operações
contábeis dos últimos cinco anos, quando por falta de clareza legal, várias
empresas desprezaram o antigo regime fiscal em operações de distribuição de
dividendos, JCP e reestruturações societárias. O pronunciamento do
subsecretário de Tributação da RFB, sr. Fernando Mombelli, aponta para o
caminho da tributação retroativa. Por isso várias empresas já estão tomando
medidas judiciais cautelares.
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