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Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 14/04/2015 - A207
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O esquema fraudulento
da Enron só foi quebrado com a falência da empresa. Vamos rezar para que possamos
subjugar a corrupção sem antes quebrar o Brasil. Talvez precisemos refletir
sobre o nosso silêncio e o nosso grau de conivência nisso tudo.
Avaliada
em quase US$ 70 bilhões a Enron foi a sétima maior empresa americana. Mesmo
assim, 24 dias foi tempo suficiente para sucumbir num turbulento processo falimentar,
o qual reunia todos os ingredientes de um gigantesco escândalo administrativo. A
maior contribuinte da campanha presidencial do então candidato George W. Bush
deixou sem emprego cerca de vinte mil funcionários. E ainda causou um prejuízo
aos fundos de pensão na ordem de US$ 2 bilhões. Pouco antes do naufrágio os
seus diretores conseguiram embolsar US$ 1 bilhão. A história da Enron é a
história da corrupção sinergética, onde todos ajudaram na construção da fraude.
Todos que deveriam dizer NÃO aos esquemas se calaram porque havia muito
dinheiro transitando na cadeia de interesses que orbitava a companhia. Todos se
aproveitaram da situação porque eram partes interessadas na gestão fraudulenta,
tais quais, corretores, financistas, especuladores, políticos e toda a nata de
Wall Street. Até a revista Fortune afirmou que a Enron era a empresa mais
inovadora da América. A coisa foi tão feia que o Nobel de economia Paul Krugman
declarou que "nos próximos anos o escândalo da Enron, e não o 11 de
setembro, será visto como o grande divisor de águas na história da sociedade
dos Estados Unidos".
É
muito difícil quebrar esquemas orquestrados por gente poderosa. Uma sardinha
que ousa invadir o terreno dos tubarões é imediatamente destroçada. O ambiente
social e institucional brasileiro é inteiramente dominado pela corrupção. Traduzindo,
um ecossistema corrosivo que não apresenta nenhuma saída ou possibilidade de
salvação (a não ser para aqueles que estão conseguindo fugir do Brasil). Os que
ficam são obrigados a engolir uma tempestade de eventos ignóbeis a inundar o país
com muita violência, impunidade, roubos e todo tipo de desgraça a contaminar o
cidadão por inteiro. Os erros são volumosos e intermitentes. Na realidade, tudo
está errado: a maluquice das leis, o império da impunidade, o aparelhamento do
Estado, a parcialidade da mídia, as relações incestuosas entre o público e o
privado, o cinismo dos discursos embusteiros, a corrupção sistêmica, o roubo
descarado com toneladas de provas que dão em nada etc., etc.
Assim
como no caso Enron, todo mundo sabe dos erros, mas todos se calam em nome do
pragmatismo e dos interesses pessoais. Como disse Maquiavel, “àquele que fizer
profissão de bondade é natural que se arruíne entre tantos que são maus”. Dessa
forma, todos os espertos são engolidos pelo sistema, onde rapidamente aprendem
o jogo das aparências e da desfaçatez. Seguir na contramão seria demonstrar
falta de profissionalismo a comprometer seriamente as boas oportunidades financeiras
que venham a surgir. O cara é bandido, mas é rico. O político é ladrão, mas
construiu um hospital. O traficante é perigoso, mas encanta a mulherada com seu
carrão...
Os
fins justificam os meios, e ética não enche barriga. Quando esses conceitos se alastram
de norte a sul ou se expandem na escala de milhões de cidadãos, chega-se por
fim a uma sociedade alinhada com toda sorte de perversidades. Tanta deformidade
moral é potencializada nos altos escalões da política, onde espetáculos
grotescos se multiplicam aos borbotões. É nesse momento que se constata o quão
baixo pode chegar o caráter do animal humano. Qualquer indivíduo minimamente
decente ficaria enojado com o circo das CPI, onde nada se investiga e onde tudo
ganha contornos de uma ridícula ópera bufa. Ou seja, todos sabem exatamente do
ocorrido, mas ninguém é doido de fugir do script; as falas são ensaiadas e as
atuações se desenvolvem de acordo com a etiqueta da conveniência. Ali, na
reunião da CPI, todo mundo conhece o grau de bandidagem do colega, mas dificilmente
alguém se arrisca a abrir o jogo, como fez o delator Paulo Roberto Costa.
Podemos
dizer que o Juiz Sérgio Moro não é uma sardinha, mas é uma habilidosa piranha
de dentes afiados o suficiente para morder o ponto fraco dos tubarões e ainda por
cima conseguir sobreviver num ambiente onde os personagens graúdos das relações
público privadas estão conectados por fortíssimos laços criminosos. Mais
impressionante ainda é a coragem de desafiar um sistema onde a corrupção reina
absoluta em todos os quadrantes da nação.
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