Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 5 / 1 / 2018 - A 319
Cabe
à lei complementar fixar base de cálculo, de modo que o montante do imposto a
integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço (CF,
artigo 155, §2º, XII, i).
O
imposto devido por substituição tributária integra a correspondente base de
cálculo, inclusive na hipótese de recolhimento do imposto correspondente à
diferença entre a alíquota interna da unidade federada de destino e a alíquota
interestadual (Convênio ICMS 52/2017, cláusula décima terceira).
No
ordenamento jurídico, o instituto do Convênio figura na base da pirâmide
hierárquica. Mesmo assim, o Conselho Nacional de Política Fazendária elevou o
Convênio 52 acima de todas as leis vigentes no país quando mandou embutir a
substituição tributária na sua própria base de cálculo. A Lei Complementar
24/1975 estabelece limites para atuação dos acordos firmados entre as fazendas
estaduais, não autorizando o Confaz a extrapolar das suas atribuições, como o
fez na aludida cláusula décima terceira (CF, artigo 155, §2º, XII, g).
Pode-se
comparar o Convênio 52 ao peão que se atreveu a mandar no chefe. Claro, óbvio,
acabou levando um sopapo no pé da orelha pra deixar de ser besta. E o tal
bofetão foi dado pela Ministra Cármem Lúcia, do STF. O ouvido do Confaz deve
estar zunindo até agora.
O
Convênio ICMS 52/2017, aparentemente, buscou estabelecer um pouco de ordem no
conturbado modelo de substituição tributária, ao incorporar os Convênios 81,
70, 35, 92 e 149. Na prática, porém, o objetivo central era o de engordar em
22% a arrecadação de ICMS, mesmo que atropelando o Estado de Direito. Essa arvoragem
do Confaz revela um profundo desprezo pela ordem jurídico/institucional. A
Sefaz/AM e as suas comparsas federativas pouco se importam com limites
constitucionais; tudo que fazem é aumentar a carga tributária a qualquer custo.
Por isso é que a legislação mais bagunçada é justamente a do ICMS. A prova irrefutável
está na suspensão dos efeitos das cláusulas 8ª, 9ª, 10ª, 11ª, 12ª, 13ª, 14ª,
16ª, 24ª e 26ª do famigerado Convênio 52 pela Ação Direta de
Inconstitucionalidade número 5866. A Ministra Cármem Lúcia demoliu quase que
todo o convênio, inclusive as disposições que passavam um verdadeiro cheque em
branco para os estados manipularem as Margens de Valor Agregado.
As
inconstitucionalidades que permeiam todo o Convênio 52 são indicadores de
outras infinitas falhas legislativas que contaminam o ICMS por inteiro. Um bom
exemplo está na substituição tributária de veículos automotores faturados
diretamente da fábrica para o consumidor. Ou seja, se não existe operação
subsequente, não há substituição tributária. Esse é um dos pilares do sistema,
quebrado por essa regra incoerente. Se a federação do comércio criasse um
núcleo de estudos tributários para dissecar o ICMS amazonense, ela iria
descobrir meio mundo de ilegalidades na entulheira normativa. Isso acontece
porque a máquina legislativa trabalha num ritmo alucinante. É um frenético mexe
remexe nas MVA, nas regras, nisso, naquilo, que ninguém sabe direito o que é
certo nem o que é errado. E como disse o eminente jurista Eurico de Santi, ter
regra demais é como ter regra nenhuma. Claro, obvio, nada é por acaso; tudo tem
um objetivo sinistro, que é impor um ambiente de completa subjetividade para
dar margem a casuísmos e interpretações sempre desfavoráveis ao contribuinte. E
também, alimentar a indústria das ações judiciais que tufam os bolsos das
celebridades do mundo jurídico. A lama burocrática é um alimento rico em
nutrientes que engorda uma fauna ambientada no caos institucional. Parece que
existe um pacto conspiratório entre jurisconsultos e legisladores.
O
que, finalmente, importa, é que o STF salvou os contribuintes dum pesadíssimo
encargo de 22% de aumento tributário que iria entrar em vigor a partir desse
mês. O bom senso prevaleceu sobre a ensandecida voracidade arrecadatória duma
máquina pública ineficiente, inchada e corrupta que só sabe resolver problemas
administrativos com aumento de imposto. Que essa medida liminar da Ministra
Cármem Lúcia sirva de estímulo para que as entidades empresariais remexam a
entulheira normativa em busca de outras ilegalidades que infernizam a vida de
quem trabalha e produz a riqueza desse país.
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