Publicado no Jornal do Commercio dia 16/10/2012 - A99
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Na
Inglaterra da idade média a maioria das pessoas vivia no campo. Devido ao fato
de estarem presos à terra dos senhores feudais, os camponeses, também chamados
de servos, eram massacrados com pesados tributos. Prevalecia a lei do cão. Quem
não pagasse os impostos exigidos pelos poderosos era brutalmente penalizado
(algo não muito diferente da nossa atual realidade). Nesse período, o rei
Ricardo Coração de Leão empreendeu uma viagem à Jerusalém e entregou o governo
do seu povo a um parente chamado João. Malandramente, João aproveitou a
ausência do rei para dobrar a cobrança de tributos. Metade ia para a coroa
inglesa e a outra metade era usada para a formação de um exército particular
capaz de garantir a permanência do suplente no trono. O estrangulamento
tributário foi tamanho que houve uma violenta revolta popular. Nessa época
surgiu a lenda de Hobin Hood, herói que roubava dos ricos para entregar aos
pobres. Ricardo voltou e recuperou seu trono depois de uma batalha sangrenta
com João. O estrago causado pelo excesso de tributação culminou na instituição
da Carta Magna em 15 de junho de 1215, que foi a primeira limitação legal do
poder real de tributar.
Alguns
séculos depois, a expansão do comércio e o desenvolvimento das cidades fez
surgir na Europa uma nova classe social, representada principalmente pelos
comerciantes. Era a burguesia, que passou a sustentar a nobreza e o clero,
classe dominante que não trabalhava e era isenta de tributos. Nesse período o
rei francês Luiz XIV dizia: “Quero que o clero reze, que o nobre morra pela
pátria e que o povo pague”. Insatisfeito com a pressão dessa classe dominante
que lhe sugava o sangue, a população promoveu um levante que resultou na queda
da Bastilha. O alto escalão da nobreza foi guilhotinado e em 1789 a Revolução
Francesa instaurou a república, a separação dos poderes, o orçamento público
etc. Nessa mesma época os Estados Unidos da América se tornavam independentes
da Inglaterra após uma guerra motivada principalmente pelo insuportável peso da
carga tributária imposta pela coroa inglesa.
Uma
das causas da Reforma Protestante foi o desejo da nobreza de ver-se livre da
excessiva tributação papal. No século XVI Matinho Lutero ficou revoltado ao se
deparar com o luxo, a soberba e a grandiosidade das construções da sede do
poder católico em Roma. Sua revolta era motivada pelo fato do povo alemão
deixar de comer para alimentar a igreja que sempre queria mais e mais dinheiro
para financiar seus projetos mirabolantes. Ou seja, muito do supremo poder da
igreja católica foi perdido devido à ganância incontrolável de engolir o
patrimônio e os recursos do povo que se matava em nome da fé. Interessante é
que justamente as nações que mais se distanciaram do catolicismo são as que atualmente
dominam o mundo.
No
Brasil do século XVIII, a prática intensiva da mineração levou à redução do
volume de ouro que era enviado a Portugal. Inconformada com isso a coroa
portuguesa comandou invasões às casas das famílias para tomar seus bens. Era a
Derrama, uma prática abusiva que desencadeou o processo da nossa libertação do
domínio português. Curioso, é que o índice normal de tributação cobrado pela
metrópole era de 20% – carga tributária considerada perversa. Tanto, que era
chamada de quinto dos infernos. Hoje, o governo devora quase 40% de tudo que é produzido
no Brasil e ninguém reclama, sendo que a maior parte dos recursos é consumida
na corrupção e nos desmandos administrativos. A sociedade, anestesiada, assiste
todos os dias a um festival de escândalos na mídia sem esboçar nenhuma reação
organizada.
Os
casos aqui tratados deveriam nos envergonhar, visto que os nossos antepassados
tinham muito mais fibra e coragem para lutar contra os abusos do poder
dominante. Ao que parece nós nos amofinamos e passamos a manter nossa cabeça
abaixada como se esperasse o golpe de um machado. O homem perdeu sua essência
nociva e o seu espírito definhou. O poder constituído, legítimo, democrático,
libertário, massacra muito mais o povo do que os bárbaros do passado. O peso da
carga tributária brasileira aumenta continuamente e o que se ouve nas conversas
com funcionários das secretarias de fazenda é que o departamento de tributação
está permanentemente debruçado em projetos de expansão dos tentáculos
arrecadatórios. O ritmo é intenso e os dispositivos normativos não param de
pipocar nos diários oficiais. Tais dispositivos ficam cada vez mais virulentos
e agressivos, pois mordem com mais força o bolso de quem sua a camisa para
produzir a riqueza do país. Será que nunca iremos fazer jus à memória dos
nossos ancestrais e também, como eles, dar um basta? Será que só uma revolução
violenta é capaz de parar a incessante majoração de tributos? Pois é! Paciência
tem limite, até para os inertes.
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