Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 14/10/2014 - A187
Um
fato inédito explodiu em todos os noticiários. Nunca antes na história desse
país um candidato à presidência da república tinha sido convocado para depor
numa comissão parlamentar de inquérito em plena campanha eleitoral de segundo
turno. O motivo do terremoto a sacudir o centro do poder federal era o
envolvimento do ilustríssimo deputado João Ernesto no escândalo da mesadinha. Um
homem tido por muitos como impoluto, amado pelo povo e destinado à grandeza
pelos feitos heroicos junto a classe trabalhadora. A concorridíssima sessão estava
entupida de repórteres, políticos, curiosos etc. Passado alguns minutos,
finalmente o presidente da sessão dá início aos trabalhos.
–
Está aberta a comissão parlamentar de inquérito 897/45. Com a palavra o
deputado Mateus Floriano, líder da bancada evangélica.
–
Deputado João, causa-me espécie a sua postura. Vossa excelência denegriu o nome
dessa casa e o nome do Senhor Jesus, e eu posso provar o que digo. Tenho aqui
em minhas mãos uma nota fiscal comprovando que vossa excelência esteve numa
boate com garotas de programa; se deixou levar pelas armadilhas de satanás,
prevaricação e luxúria do tinhoso... E pagou toda essa esbórnia com cartão
corporativo do governo. Como é que vossa excelência explica isso?
O
deputado João Ernesto pega a nota, examina atentamente...
–
Ué!, nobre deputado, me causa espécie. E quando digo me causa espécie,
traduzindo, quero dizer: vá se ferrar...
Muito
barulho na plateia.
–
Essa nota é a tua – murmura baixinho o Deputado Ernesto.
O
barulho continua até que se ouve uma voz no alto falante:
–
Ordem no recinto...!!!
E
o deputado João continua sua análise em voz baixa:
–
Exatamente, Mateus. Naquele dia eu não gastei dinheiro com champanhe, lá, na
boate Gatas Arretadas. Portanto, essa nota aqui é a tua.
Ao
que o ilustre deputado da bancada evangélica, Dr. Mateus Floriano, retruca
sussurrando:
–
Tem razão. Mas estou com a tua nota no bolso da calça.
O
deputado Mateus retira outra nota do bolso e esbraveja em voz alta.
–
Esta nota aqui é a prova de que o deputado Ernesto envergonha a todos nós,
parlamentares, com sua conduta deplorável, pervertida e corrupta...
Todo
esse furdunço de caráter surreal faz parte da produção nacional O Candidato
Honesto, atualmente em cartaz nas salas de cinema. O filme é uma síntese
venenosa do universo político brasileiro, onde se pode enxergar com muita
clareza o oceano de podridão em que está mergulhada a nossa administração
pública (os produtores não pouparam nada nem ninguém). Nessa comédia bem
humorada, o espectador é convidado a visitar o submundo dos esquemas políticos,
que na prática já não é tão submundo assim, visto que atualmente tudo é feito a
luz do dia.
Infelizmente,
há muito tempo os nossos homens públicos perderam o pudor. Tanto, que uma
dessas criaturas hediondas chegou ao absurdo de mostrar o pálido “derrière”
para uma delegada de polícia. Mesmo assim, a consequência de tão inusitada
atitude foi o honroso posto de Deputado Federal, obtido com expressiva votação.
Pois é!! Isso é a cara Brasil: uma mistura de corrupção com pornografia que se
transforma em objeto folclórico. Ou seja, todo mundo cai na gargalhada e em
seguida vota no presepeiro. Tiririca, por exemplo, agiu de forma inteligentíssima
ao explorar um nicho eleitoral tão abundante. Pior de tudo, é que esse tipo de
coisa dificulta por demais o trabalho daqueles que tentam fazer algo sério no
setor público. Em meio a tanta estripulia fica difícil distinguir o joio do
trigo.
Voltando
ao filme, toda a bagaceira espalhafatosa exibida na telona retrata fielmente a
trágica realidade de boa parte da nossa política e dos seus personagens
asquerosos, os quais são desprovidos de qualquer diminuto traço de decência. Há
outra cena perturbadora nessa obra cinematográfica, que mostra o deputado
Ernesto dando lições de roubo e trapaça para os filhos. Diante de tamanho
disparate fica no ar a pergunta: Será que algo tão nojento acontece de fato no
seio familiar dos nossos homens públicos? É possível que sim. Do contrário, como
se poderia explicar a perpetuação de algumas espécies perniciosas no
ecossistema político brasileiro?
Espanta
o fato de a nossa classe política ser um saco de pancadas capaz de absorver
todo tipo de achincalhamento sem que nenhum representante saia em defesa dos colegas.
Se alguém, por exemplo, esculhambasse engenheiros ou taxistas de forma
semelhante ao que ocorreu no filme supra citado, certamente haveria uma reação
imediata em todos os cantos do país. Mas os políticos, não. Nenhum deles tem
coragem nem a hombridade de defender um colega de classe, exceto em alguns raríssimos
episódios. Também, pudera!! A mídia em geral não para um minuto sequer de noticiar
escândalos e mais escândalos de roubalheira e corrupção. A bagaceira é tão
volumosa que transborda das páginas dos jornais e dos horários televisivos. Resumindo,
estamos muito, mas muito mal representados.
OUÇA A SESSÃO DA CPI DA MESADINHA
OUÇA A SESSÃO DA CPI DA MESADINHA
#LeandroHassum
#OCanditadoHonesto
#Política
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua mensagem será publicada assim que for liberada. Grato.