Doutor Imposto
Publicado no Jornal Maskate dia 10/12/2015 - A020
A
recente prisão de um senador da república atiçou a revolta de muitos doutos e
eruditos senhores da lei, que viram nesse episódio uma afronta ao “estado de direito”.
Afinal de contas, o nosso modelo jurídico não considera a possibilidade de
prisão para ricos e poderosos. Esse tipo de penalidade é reservada aos pobres,
negros e ladrões de galinha. As leis que regem o nosso querido Brasil possuem
duzentas mil escapatórias para facínoras que praticam roubos na casa do milhão
pra cima. Por exemplo, os políticos possuem tratamento especialíssimo. Tão
especial que o sistema jurídico criou uma grossa blindagem em torno daqueles
que habitam os altos círculos do poder. São tantos os detalhes, pormenores,
exceções, privilégios e artifícios jurídicos que a politicada se acostumou com
a ideia de jamais ser enjaulada. Prova disso, é o quilométrico histórico de
processos arquivados envolvendo diversos figurões. Isso dava uma tranquilidade
tamanha aos pilantras de colarinho branco que eles deixaram o cinismo de lado, passando
a escarnecer e a tripudiar sobre a indignação popular. Daí, o motivo do espanto
e da revolta contra as recentes operações da Polícia Federal. Na cabeça de
muita gente os ricos e poderosos jamais poderiam ser presos no Brasil. Mas de
forma nenhuma!!
Um
texto maravilhoso da jornalista Claudia Wallin traça um paralelo entre os
modelos políticos brasileiro e sueco. Pra começo de conversa, qualquer cidadão
pode apresentar uma denúncia criminal contra qualquer político investido de
qualquer cargo público, obrigando as autoridades suecas a adotar os
procedimentos investigatórios adequados. Ao contrário do Brasil, nenhum
político sueco tem direito a imunidade parlamentar, que na lógica do povo
escandinavo nada mais é do que um salvo-conduto para roubar, desviar e achacar.
Políticos suecos não têm foro privilegiado – nem mesmo a pessoa investida do
mais alto cargo do país.
Na
Suécia, nunca houve um caso de suspeita de corrupção contra um presidente do
Parlamento. Esse tipo de coisa é absolutamente inadmissível e intolerável. Nas
terras frias do norte os políticos são obrigados a se afastar das suas funções
até mesmo quando são flagrados numa blitz por beber e dirigir. Aqui no Brasil,
o político espanca mulher, estupra meio mundo de ribeirinhas, mostra a bunda
pra delegada, atropela e mata no trânsito, rouba, mente, desvia, ameaça, corrompe,
achaca e a população encara todas essas barbaridades com a maior naturalidade
do mundo.
Para
o brasileiro comum não existe motivo nenhum que o faça desistir de votar no seu
candidato do coração, o que nos faz acreditar que não existe senso de
moralidade no Brasil; não cabe na cabeça de muita gente a noção do bem e do
mal. O roubo, a desfaçatez, a corrupção, tudo isso é perfeitamente tolerável e
aceitável num político, desde que o eleitor ganhe um pão com mortadela no dia
das eleições.
Lamentavelmente,
somos obrigados a engolir o fato de que a estrutura corrupta que domina o nosso
sistema político é sustentada pela cumplicidade da massa populacional. No dia
em que a honestidade pautar a conduta do cidadão brasileiro, todos os políticos
bandidos cairão dos seus postos.
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