segunda-feira, 29 de setembro de 2025

GUERRA DO ARCO-ÍRIS


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  26 / 09 / 2025 - OP009
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Era uma vez três reinos que ficavam assentados em três grandes nuvens: o reino vermelho, o reino amarelo e o reino azul. Os integrantes de uma localidade podiam avistar ao longe os dois vizinhos, mas não dispunham de tecnologia que permitisse o deslocamento de uma nação à outra. As pessoas estavam separadas por um profundo abismo. Cada cidadão era obrigado a contemplar, valorizar e defender a cor dominante do seu povo. No reino vermelho tudo era vermelho: as roupas, as joias, as paredes, os tapetes etc. Afinal de contas, o vermelho era lindo. No reino amarelo, da mesma forma. Os habitantes do reino azul eram ardorosamente fanáticos pela cor safira. Quando alguém criava um novo tom de azul, logo se transformava numa celebridade instantânea.

 

Numa bela manhã de outono o cientista mais famoso do reino amarelo criou um revolucionário equipamento de transporte aéreo. Então, logo em seguida ele resolveu fazer um teste: viajou no protótipo até o reino vermelho. Chegando lá, encontrou uma bela mulher de lábios saborosamente vermelhos que, obviamente, vestia um magnífico vestido vermelho. Os dois se apaixonaram de imediato e começaram a namorar. Uma denúncia anônima levou os agentes da lei a perseguir o casal até que foram apanhados em flagrante. A mulher foi presa, mas o homem voltou para casa levando consigo uma rosa vermelha que recebeu da sua amada. Na sequência do regresso, o cientista apresentou sua criação às autoridades que de imediato prepararam uma grande cerimônia para comemorar tão importante conquista. Eis que ao receber a premiação o inventor exibiu a rosa vermelha para a plateia. O gesto chocou a todos. Por conta de tamanha heresia o desventurado foi do céu ao inferno em poucos minutos, sendo recolhido de pronto a uma penitenciária de segurança máxima.

 

Com a tecnologia de transporte dominada, um imenso contingente de soldados amarelos partiu para a conquista do reino vermelho. Mal sabiam eles que o reino azul estava fazendo a mesma coisa. Ou seja, o reino vermelho estava sendo simultaneamente atacado pelos dois vizinhos. Cada grupamento desembarcou no terreno inimigo armado até os dentes com pincéis e latas de tinta. O objetivo era modificar a cor de tudo que fosse encontrado pela frente. Os bravos soldados vermelhos resistiram heroicamente. Em meio a tantos jatos de tinta aconteceu um fenômeno inusitado, que foi a explosão de belíssimas outras cores desconhecidas dos presentes até então. Por isso, todos pararam e ficaram encantados com o que viram. Os combatentes nunca poderiam imaginar que o trabalho conjunto poderia resultar em possibilidades tão diversificadas. Ou seja, em vez de passar a vida inteira presos numa vida monocromática, eles agora poderiam interagir e trocar experiências para conferir mais alegria e enriquecimento às suas atividades diárias. Desse dia em diante os reinos passaram a ser multicoloridos.

 

Essa história mostra como as pessoas tendem a se fechar em grupos herméticos. Nas empresas, constroem os famosos setores estanque, onde proliferam rivalidades e hostilidades entre colegas de trabalho. Até a comunicação entre indivíduos de grupos rivais tende ser meramente protocolar e limitada, concorrendo assim para o isolamento dos funcionários. Cada grupo faz um imenso esforço para ser mais importante que o outro. Nessa disputa, diversas armas são utilizadas e cada conquista é comemorada, gerando um clima de desavenças. A rivalidade mais comum acontece entre o pessoal da administração e o da produção. Geralmente, os funcionários da administração são os queridinhos da diretoria, enquanto que os empregados da produção ficam meio que esquecidos em galpões imensos, quentes e barulhentos.

 

A rivalidade entre setores só enfraquece a empresa, que, de alguma forma ou em algum momento acaba prejudicando a todos. A maioria desconhece as infinitas possibilidades de crescimento profissional e de melhoria do ambiente de trabalho caso resolvesse se comportar como um único grupo coeso. Curta e siga @doutorimposto. Outras centenas de artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br como também, informações sobre treinamentos online e presencial.










 


























EMPRESA VIGOROSA; FUNCIONÁRIO CAPACITADO


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  19 / 09 / 2025 - OP008
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Tempos atrás, ministrei quatro noites de treinamento ICMS num grande grupo comercial manauara. O conteúdo programático foi adaptado para se ajustar às demandas dos setores financeiro e de compras, mas as equipes dos setores contábil e fiscal também se fizeram presentes. Na verdade, faz muitos anos que recebo alunos dessa empresa nas minhas turmas regulares, o que atesta a qualidade dos nossos serviços.


Pude observar no decorrer das aulas o ambiente sadio e colaborativo da empresa, com alunos atentos e participativos. Outro fato curioso estava na disposição das pessoas. Ministro aulas há muitos anos, em que, normalmente, os alunos expressam um semblante fatigado depois de um dia inteiro de trabalho. Inclusive, eu costumo esperar uma intensificação desse cansaço no final do treinamento. Mas nessa empresa manauara, os alunos mantiveram uma surpreendente energia até a conclusão dos trabalhos, com alegria, entusiasmo e vibrações positivas.

 

O ambiente de trabalho saudável interfere diretamente no desempenho positivo duma empresa. Esse clima auspicioso é percebido pelo cliente, que também sente as energias ruins dum espaço insalubre. Por exemplo, uma famosa livraria de Manaus sempre me chamou a atenção, justamente, pelas expressões taciturnas dos funcionários. Tempos depois, eu soube da infinidade de ações trabalhistas envolvendo essa empresa.

 

Voltando às políticas de capacitação profissional, as empresas mais fortes são aquelas que estão sempre investindo na qualidade dos seus colaboradores. Isso mostra que forças individuais bem trabalhadas se multiplicam num encadeamento sinérgico altamente positivo, conferindo sustentabilidade aos diversos aspectos do negócio.

 

Dentre tantas variáveis para se trabalhar, uma merece atenção especial. Trata-se da interpretação duma nota fiscal. Parece algo simplório, mas a nota fiscal é uma verdadeira esfinge por guardar muitas codificações. Na verdade, a nota fiscal “conversa” com seu interlocutor. E ao “falar”, transmite diversas informações importantes.

 

A pessoa que conhece a “linguagem” da nota fiscal decifra várias codificações no momento em que escaneia os dados com o olhar. Essa pessoa combina UF de origem com CST da tabela “A” para checar se a alíquota ICMS está correta. Também, verifica se CST mais CFOP bate com a retenção de ICMS-ST. Ainda é possível observar se o CST da tabela “B” está alinhado com alguma isenção ou redução de base de cálculo etc. A divergência de valores envolvendo campos específicos é capaz de indicar alguma particularidade fiscal. E as empresas da ZFM podem saber se as desonerações tributárias foram aplicadas corretamente.

 

Quando aqueles que manuseiam a nota fiscal dominam suas codificações, os riscos de erros diminuem bastante na cadeia de informações. Em muitas empresas, os erros são detectados no departamento fiscal após o prazo de cancelamento ou depois do recebimento da mercadoria. Outro fato corriqueiro está nos acordos do setor de compras com o fornecedor que posteriormente são modificados após emissão da nota fiscal. Ou seja, surgem valores não previstos na negociação.

 

Mais um problema recorrente nos setores de compra está na dificuldade para garantir benefícios tributários. Um bom exemplo, são os implementos agrícolas ou máquinas industriais ou insumos agropecuários ou alguns produtos hospitalares etc. Ocorre que, em muitas vezes, briga-se por algo indevido ou então perde-se vantagens por não saber dialogar com o fornecedor. Há casos ainda mais graves, como, por exemplo, o da empresa manauara que aceitou uma indevida retenção de ICMS-ST com MVA ajustada erroneamente, de 53,13% para 73,67%. Por consequência, ao invés de pagar R$ 22.133,24 via notificação lançada em DTE, a empresa pagou na nota fiscal o valor retido de R$ 30.120,63. Tanto prejuízo numa só nota fiscal revela o péssimo nível de gestão fiscal e empresarial.

 

Para quem insiste nos modelos tortuosos e anacrônicos, é bom ficar atento ao fenômeno da inteligência artificial. Um grupo empresarial do interior amazonense está revolucionando seus processos internos, garantindo eficiência e redução de custos. O resultado é materializado na forte expansão dos negócios. Curiosamente, o processo de modernização demandou significativo investimento na capacitação profissional dos seus colaboradores. Curta e siga @doutorimposto. Outras centenas de artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br como também, informações do treinamento online sobre codificações da nota fiscal.



































IMPOSTO NÃO É CAPITAL DE GIRO


Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  12 / 09 / 2025 - OP007
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Em todas as aulas de ICMS eu mostro um gráfico que separa receita dos tributos embutidos. Digo então para os alunos que a empresa deve trabalhar com a parte que sobra. Mas também comento que poucos trabalham dessa forma, já que a receita total é utilizada para cobrir gastos abrangentes.

 

A composição do preço resulta na soma do custo mais despesas mais lucro mais tributos embutidos. Sendo assim, quem compra acaba pagando várias coisas. E quem vende, recebe a sua parte e também aquilo que não é seu (tributos). Desse modo, a empresa intermedeia uma taxação entre o fisco e o contribuinte de fato. Evento semelhante ocorre nas retenções de imposto de renda que obviamente são repassadas à RFB. As retenções de ICMS substituição tributária das operações internas têm prazo curto para recolhimento. E nas operações interestaduais o recolhimento é no dia da emissão da nota fiscal, se não houver inscrição de substituto na Sefaz do destino. Inclusive, a apropriação indébita sujeita o responsável à ação criminal (Art. 390 RICMS-AM). A lógica de tais retenções deveria alcançar ICMS, PIS, Cofins embutidos no preço. Mas não é isso que acontece.

 

O motivo de tanta confusão está no sistema de “cálculo por dentro”, que reside na fonte de muitas distorções rocambolescas. A primeira delas resulta no crescimento expressivo da carga tributária porque todos os elementos da formação de preço são base uns dos outros. Em aula, mostro uma planilha com preço final de R$116 sem tributos embutidos. Noutra planilha com tributos embutidos o preço vai para R$200. Por exemplo, ICMS calculado sobre R$116 resulta em R$23 (cálculo por fora). O valor do mesmo ICMS calculado “por dentro” é de R$40. Portanto, fica evidente um propósito nefasto de multiplicação do peso tributário. A classe empresarial deve ficar atenta porque o fisco tenciona incluir CBS na base do ICMS para compensar a extinção de PIS/Cofins já no ano de 2027. Com a eliminação de PIS/Cofins na formação de preço, o ICMS será naturalmente reduzido. E isso preocupa as administrações fazendárias.

 

Outra característica do cálculo “por dentro” está na ocultação tributária aos olhos do consumidor, que não enxerga uma coisa separada da outra. Isso é por demais conveniente ao governo que taxa horrores sem mostrar as garras. O efeito colateral desse mecanismo está na dificuldade de executar punições mais severas. Ou seja, teoricamente, o imposto foi embutido no preço, mas, na prática, meio mundo de gente não faz isso. Sendo assim, não tem como criminalizar uma apropriação inexistente. Inclusive, todo empresário que faz a “coisa certa”, vê seus preços subirem expressivamente porque o concorrente ignora tributos na composição do preço.

 

A reforma tributária elimina essa confusão dantesca, visto que não haverá tributos embutidos na formação do preço. O que ainda não está claro, é como ficará a etiqueta de preço. Ou seja, será juntado produto com imposto ou ficará somente o produto, ou as duas coisas separadas? Já se sabe que na nota fiscal, produto e imposto não serão misturados como acontece atualmente. Sendo o imposto cobrado “por fora”, o vendedor receberá do cliente o valor do objeto vendido e ainda aquilo que não lhe pertence, não havendo argumento sustentável para ingressar o imposto no fluxo de caixa. Essa nova sistemática dará um poder gigante ao fisco que enxergará cada centavo pago pelo consumidor. É bom lembrar que imposto não é capital de giro.

 

Como a tributação do consumo será “não cumulativa”, haverá um grande mecanismo para controlar as movimentações de cada empresa, em que o crédito será validado após efetiva verificação de recolhimento, conforme determinação do inciso II do parágrafo 5 do artigo 156A da CF. Se tal regra funcionar plenamente, o fisco não poderá dificultar a restituição de créditos, já que tal procedimento teria um caráter de apropriação indébita. Ou seja, se a retenção tributária não repassada ao fisco é roubo, roubo também é o crédito que o fisco criar dificuldade para restituir. O problema é que o mecanismo “split payment” fará marcação cerrada na questão dos créditos tributários, enquanto a LC214 criou espaço para o fisco retardar tais restituições. Se o governo quer impor um ambiente de seriedade e de respeito, ele também deve fazer a sua parte. É bom lembrar que crédito acumulado não é receita do fisco; é dinheiro que foi arrecadado antes e que não deveria ter sido.  

 

Outra coisa inquietante está na tributação dos adiantamentos a fornecedores, como se a taxação incidisse sobre movimentação financeira. Ainda não se sabe o procedimento operacional, tipo, funcionamento das chaves de controle sobre tais operações. Isso vai complicar as industrializações por encomenda e possivelmente gerar contencioso fiscal. Curta e siga @doutorimposto. Outras centenas de artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br como também, informações do treinamento online sobre codificações da nota fiscal.

























quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Teorias conspiratórias dum contencioso galopante

Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio  dia  05 / 09 / 2025 - OP006
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O Brasil é a meca das relações promíscuas entre público e privado, onde esquemas mirabolantes são costurados em jantares inapropriados com participação de figuras notáveis que deveriam se manter reservadas. Em tais circunstâncias são acertados os mecanismos propulsores de eventos fabulosos, os quais acontecem de modo absolutamente natural e corriqueiro sem que ninguém se dê conta do fato inusitado. Inclusive, os recorrentes escândalos dissecados nas CPI expuseram as vísceras de esquemas diversos, mostrando que o setor público é uma fonte brutal de artimanhas rocambolescas.

 

Pois é. Feitas as apresentações, vamos ao próximo passo da nossa jornada nebulosa. Todos conhecem a velha máxima maximizada no jeitinho brasileiro: “criar dificuldade pra vender facilidade”. De tão incrustado nos nossos ossos, isso já virou uma imagem primordial – um arquétipo que pulsa fortemente todas as vezes que somos confrontados por questões burocráticas.

 

As pessoas escaldadas e atentas sabem de histórias nebulosas envolvendo legislações encomendadas ou gestadas nas madrugadas ou escamoteadas ou de efeito rápido e direcionado – tudo sempre temperado com muito jogo de interesse. E a fonte que mais parece um vertedouro de Itaipu é justamente a poderosíssima indústria do contencioso fiscal que movimenta bilhões em serviço$ jurídico$. Detalhe importante: Tudo dentro da legalidade. 

 

A explosão de processos judiciais nas últimas décadas guarda uma estreita relação com o incremento de normas conflituosas, num frenético processo de retroalimentação (um fomenta o outro). O pior de tudo é que as forças sobrenaturais trabalham incansavelmente na piora desse estado de coisas, o que deixa o empresariado apreensivo quanto ao agravamento da insegurança jurídica. Naturalmente, muita gente vai dizer que tais insinuações destoam da realidade e que narrativas conspiratórias são fruto de condutas levianas.

 

Vamos então viajar na maionese conspiratória, cujo roteiro inicia na Constituição Federal de 1988, que entregou a totalidade do ICMS para o remetente quando o destinatário em outra UF era pessoa física, chafurdando assim o conceito de “tributo sobre consumo”. Tal distorção foi ardilosamente cultivada para gerar demandas judiciais. Os detalhes e os mecanismos foram discutidos na calada da noite entre partes interessadas no próprio bolso.

 

Para ganhar mais dinheiro era preciso jogar titica no ventilador e assim promover um clima de instabilidade junto a classe empresarial, que caiu de paraquedas numa disputa de entes federativos estaduais. Isto é, na briga entre o mar e a montanha, quem sofre é o marisco. Sendo assim, as eminências pardas articularam a publicação do Protocolo ICMS 21/2011 para instituir um sistema de repartição tributária, mesmo sabendo que esse instrumento violava o ordenamento jurídico. Ocorre, que a intenção era justamente esculhambar o sistema legal e assim empurrar as empresas no abismo litigioso, fortalecendo a indústria do contencioso. Até a revogação pelo STF (ADI 4628 e 4713; RE 680089), muita gente ganhou muito dinheiro e muito documento jurídico foi produzido no ciclo de todo o processo.

 

Finalmente, em 2015, a supracitada repartição tributária foi legalizada pelo instrumento apropriado (EC87). Ocorre, que a mesma patota de sempre enxergou mais uma oportunidade de ganhar muito dinheiro quando promoveu a regulamentação por meio de convênio (C93), e não por lei complementar, como manda a CF. Novamente, nascia um filão promissor a entupir os advogados de serviço. No meio desse xadrez de compadres, o STF cuidou de arrastar a questão por meia década e assim deixar o ambiente mais convulsivo e mais demandante até que a montanha de processos ficasse maior que o Monte Everest.

 

No início de 2021 o STF exigiu lei complementar que deveria ser publicada até dezembro. Pois bem. Os parlamentares, intencionalmente, amarraram o trâmite legislativo para garantir mais insegurança jurídica, e assim encaminharam o resultado para sanção presidencial já no apagar das luzes de 2021. As forças ocultas, até então, vinham atuando magistralmente, mas faltava o xeque-mate, que foi dado pelo presidente ao sancionar a LC190 no início de 2022. Os capitães da indústria do contencioso festejaram por dias, mais essa conquista espetacular, já que foi aberta mais uma frente de batalha fabulosa a gerar cifras astronômicas. Bola da vez: anterioridade anual. E assim segue o Brasil, manobrado por forças imperiosas. Só não se sabe até quando esse modelo vai perdurar. Fato indubitável é que o Brasil morre no final do filme. Curta e siga @doutorimposto. Outras centenas de artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br como também, informações do treinamento online sobre codificações da nota fiscal.