quarta-feira, 27 de abril de 2011

Novos tempos, novos desafios

Reginaldo de Oliveira

Publicado na revista Editor Fiscal - maio/2011 - pág. 34

Artigos publicados


OUÇA A CANÇÃO

“É a verdade o que assombra; o descaso que condena; a estupidez, o que destrói. Eu vejo tudo que se foi e o que não existe mais...” Renato Russo canta essas palavras com sentimento de alerta misturado com lamento. De fato, raras são as pessoas que apreciam mudanças tempestuosas, principalmente o empresário aturdido com o impacto de tantas modificações fiscais ocorridas nos últimos anos. Foi-se o tempo da empresa que só se preocupava em vender e receber; tempo em que gestão contábil/fiscal era coisa de multinacional. A realidade agora é outra e sua teimosia ostensiva anda assombrando aqueles que insistem no velho modelo de negócio. Não basta somente vender, é preciso controlar os processos sistêmicos da empresa.

O empresariado brasileiro é historicamente averso a controles de processos internos. A maioria começou com um pequeno estabelecimento onde podiam utilizar o olhômetro para controlar tudo ao seu redor. Com o passar dos anos as estruturas se expandiram, com exceção de uma determinada região do cérebro desses empreendedores. Ou seja, por mais que o volume de operações se agigantasse, mantinha-se a mesma prática administrativa lá do tempo da lojinha. Quando surgia a necessidade de automatização de processos críticos do negócio, a opção escolhida era sempre a mais barata, não importando a qualidade da informação produzida e tampouco a capacitação profissional dos empregados.

Confúcio mencionou dois métodos para adquirir sabedoria. Primeiro, através da reflexão, que é o mais nobre; segundo, por meio da experiência, que é o mais amargo.

Apesar da onda de reclamação e resistência ao projeto SPED, pode ser que esse novo conjunto de obrigações impostas pelo governo provoque uma oportuna e necessária revolução na cultura empresarial brasileira. De forma geral, todos estão despertando e aprendendo, seja pela reflexão ou pela experiência. Até os anacrônicos estão se mexendo porque o bolso deu o alerta. Já os sensatos, além de estarem se municiando com recursos estratégicos para se adaptarem a esse novo ambiente, estão também visualizando as vantagens do SPED. A mais importante é que finalmente o computador deixará de ser um instrumento que encarece e complica processos manuais. Ao contrário do que muitos vaticinavam o computador não opera milagres. Ao invés disso, já causou muita confusão em empresas que funcionavam muito bem antes dele.

O sinal de alerta soou no caixa. Como fica cada vez mais difícil sonegar, todo centavo precisa ser economizado. Assim, muitos estão percebendo que o ralo do desperdício de dinheiro está no alto custo da enferrujada e ineficiente máquina administrativa – os processos são praticamente inexistentes, as pessoas são despreparadas, os recursos de informática são insuficientes, gestão estratégica é palavrão.

Quem saiu na frente já sincronizou seus processos comerciais com fornecedores e clientes, onde a comunicação é eletrônica e os resultados das operações é todo absorvido pelo sistema interno de informática, preservando assim a integridade da informação. Aqui, a palavra-chave é cadastro. Cadastro é o núcleo onde ao seu redor gravita uma série de operações. Cadastro eficiente requer inteligência, profissionalismo, atenção e muito capricho.

A automatização inteligente dos processos de compra, armazenamento, venda e recebimento produz conhecimento suficiente para alçar a empresa à níveis mais altos de controle, como por exemplo, gestão integrada de processos, prática orçamentária, gestão de risco, elaboração de cenários e análise estratégica do negócio. Para que essa linha seja percorrida o empresário precisará reinventar-se a si próprio e sair do estado de paralisia de paradigma. Alguma coisa deverá ser feita, mesmo que seja preciso bater a cabeça na parede até surgir uma faísca de iluminação.

O caminho é sem volta e a complexidade só aumenta a cada dia que passa. 2012 é anunciado com o ano em que os pequenos e médios empresários passarão pelo teste mais importante do SPED, que pouco tempo atrás sacudiu as grandes empresas. Não é absolutamente necessário tornar amarga essa travessia; é possível fazê-la de forma serena. Tudo é uma questão de escolha. O mercado dispõe de recursos e tecnologia para prover de subsídios aqueles que estão dispostos a encarar as mudanças de forma positiva. Há também entidades educacionais prontas para capacitar tanto empregados quanto patrões.

A canção tratada no início do texto termina da seguinte forma: “E nossa história não estará pelo avesso assim, sem final feliz. Teremos coisas bonitas pra contar. E até lá, vamos viver. Temos muito ainda por fazer. Não olhe pra trás; apenas começamos. O mundo começa agora. Apenas começamos”.




domingo, 3 de abril de 2011

JUSTIÇA FISCAL

Reginaldo de Oliveira

Publicado na revista Editor Fiscal - abril/2011 - pág. 32

Por anos a fio acompanhamos as incansáveis vozes que vêm nos alertando para o insustentável peso da carga tributária. As diversas instâncias das entidades fazendárias habituaram-se ao despudor de majorar os impostos a seu bel-prazer, convictas de que o contribuinte engoliria todos os sapos que empurrassem na sua garganta. Para esquivar-se da voracidade do Fisco, o contribuinte se acostumou à prática descarada da sonegação. O resultado dessa sopa de rapadura com jiló é um ambiente tributário funesto.

A deformação da nossa realidade fiscal culminou numa espécie de violação do inciso II do artigo 150 da Constituição Cidadã, que proíbe tratamento desigual entre contribuintes. O mais articulado e enfronhado nos altos círculos do poder escorre ileso pelas garras do Fisco, enquanto o ingênuo e deslocado do esquema é incumbido de pagar o pato – pagar por ele e pelo outro. Afinal de contas, o Estado precisa saldar seus compromissos.

Até que ponto um hospedeiro suporta o carcinoma que lhe exaure as forças?

Um fenômeno relativamente recente aponta para um novo ordenamento desse cenário dantesco. O projeto SPED vem gradualmente demonstrando seu propósito - seus múltiplos tentáculos estão se movimentando com agilidade vertiginosa. As consequências, nesse primeiro estágio, são tortuosas. Ou seja, aquele que sonegava agora está pagando demais. Na conjuntura anterior o Fisco utilizava um canhão sem alça de mira na expectativa de que os estilhaços do projétil respingassem em um ou outro contribuinte. Agora, o canhão está com mira laser (o tiro é preciso e desproporcional). O SPED pode desencadear uma ruptura do atual modelo tributário e provocar uma revolução na cultura empresarial brasileira. Quando todos estiverem pagando, todos se unirão em bloco para exigir um ambiente tributário mais justo e organizado.

O grande problema é que a maioria dos contribuintes brasileiros nunca exerceu plenamente sua cidadania; nunca cumpriu plenamente seus deveres nem jamais teve noção exata dos seus direitos. Nesse quesito, somos uma nação de analfabetos. Problema maior é que agora a balança pendeu para um dos lados. O coletado não tem mais como fugir dos seus deveres e não sabe como exigir os seus direitos.

Fazer valer o direito é algo muito mais complexo do que se pode imaginar, visto que para mudar um homem é preciso começar pela avó dele. Como determinadas modalidades de reivindicações são rarefeitas, os juízes não possuem familiaridade com certos tipos de demandas. Quanto aos órgãos fazendários, esses negam acintosamente direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, legislação complementar e até mesmo no próprio Regulamento do ICMS, como é o caso do represamento de créditos fiscais de uma infinidade de contribuintes que o órgão se recusa a compensar com débitos da mesma natureza tributária. Aos requerentes é transmitida a mensagem de que é mais inteligente engolir o sapo calado do que passar anos se desgastando na Justiça.

As cristalizações jurisprudenciais são consequências das demandas da sociedade via intenso debate e questionamento envolvendo interesses dos mais diversos. No caso específico da matéria tributária tais questionamentos se concentram mais na visão dos teóricos do que no exercício prático nos tribunais. Daí, o motivo da intransigência das instâncias administrativas fazendárias e reticência dos juízes, que muitas vezes se debruçam em elucubrações para decidir o óbvio e insofismável.

Será que o nosso subdesenvolvimento é a razão da existência desse estado de coisas? Ou será que o cerne do desenvolvimento de um país está justamente na mentalidade do seu povo? Desenvolvimento é uma questão de atitude? Se positivo, por que então não agir?

O filósofo alemão Peter Koestenbaum afirmou que a coragem é o reino da vontade. Assim, está mais do que na hora do encurralado contribuinte reagir, visto que a inércia dos resignados é a pedra angular que sustenta a tirania do Fisco. Se a maioria se levantar em ações judiciais o país vai parar devido ao extenso leque de inconstitucionalidades que permeia toda a legislação tributária. A coisa está tão contaminada que remendo nenhum será capaz de dar jeito nesse salseiro.

Conclui-se que o caminho mais inteligente é o da legalidade. Cumprindo seus deveres legais, o contribuinte terá poder suficiente para colocar o Fisco no seu devido lugar. Não há outra saída!! É isso ou continuaremos nessa balbúrdia que sérios problemas têm trazido ao nosso país.




sábado, 29 de janeiro de 2011

O RASTRO DA ONÇA

Reginaldo de Oliveira
reginaldo@reginaldo.cnt.br
Publicado no Jornal do Commercio edição 30_31/01/2011 – Manaus/AM - pág. A4
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Avizinham-se ondas e mais ondas que irão varrer uma significativa parcela do nosso ambiente empresarial – uma força tsunâmica que atropelará principalmente os incautos e despreparados. Após anos de anúncios, parece que dessa vez é pra valer. O Fisco diz que finalmente está alcançando a tão propalada inteligência fiscal (Protocolo ICMS 66/2009). Tal empreitada é seriamente comprometida por um fenômeno que há décadas emperra o desenvolvimento do país. Trata-se do descompasso entre a prolixa e indecifrável complexidade da legislação tributária e a sua efetiva aplicabilidade. Basta lembrar que os técnicos de uma conceituada “software house” alemã não conseguiram preparar o mais poderoso sistema de gestão conhecido para atender as necessidades fiscais da maior empresa do Brasil. Isso, apesar de muito dinheiro despejado no projeto. Se uma empresa de porte gigantesco, que investe maciçamente na capacitação do seu capital intelectual passa diariamente por dificuldades relacionadas ao cumprimento das normas tributárias, que dirá as que não dispõem de tantos recursos.

Ao longo de anos vivemos uma esquizofrenia tributária onde a aplicação de procedimentos fiscais está dissociada do texto da lei. Isso acontece porque os dispositivos legais estão entremeados por uma série de condicionantes pormenorizadas, que ainda por cima encontram-se conectadas a uma teia de normativas profusas que se expandem e se multiplicam em escala geométrica. O legislador é também prolífico na criação de regulamentos absolutamente impraticáveis. Um bom exemplo são as regras da substituição tributária do ICMS que estabelece particularidades tão minuciosas que nem o próprio ente arrecadador respeita. Daí o motivo de peregrinações diárias à Praça 14 para se dizer ao Fisco que ele não aplicou a lei que ele mesmo criou.

Não era de se esperar que o legislador imprimisse racionalidade às normas tributárias? A quem interessa tanta complicação? Por que as coisas desembocam em uma confusão dos diabos? Será que não está aí o combustível que alimenta a corrupção? De certo, quem se beneficia dessa mixórdia é a indústria das ações judiciais. Aquele que se aventura na aplicação da legislação tributária em sua profundidade absoluta mergulha num labirinto sem fim. Não é à toa que tanto se fala, mas não se combate a famigerada insegurança jurídica, principalmente o aspecto da ilegalidade potencial, quando o cidadão é impossibilitado de cumprir todas as normas estatais destinadas a regulamentar a sua vida. Daí, que para garantir a funcionalidade das suas operações muitas empresas se utilizam de expedientes tortuosos, como o tráfico de influência, para se manter na legalidade – um paradoxo dentro do paradoxo. Ou seja, se valem da consultoria de altos funcionários públicos para garantir a proteção do seu patrimônio.

A onda do momento, que tem provocado muito rebuliço, é o projeto SPED. O prognóstico aponta para a total sistematização da estrutura fiscal do Brasil, onde as operações de todas as empresas estarão interligadas em um único sistema – uma espécie de “big brother” que lembra o filme Matrix. O ponto crítico desse ambicioso empreendimento está na sua incompatibilidade com a realidade tributária brasileira. Se o SPED terá tentáculos suficientes para alcançar em profundidade tudo quanto é operação fiscal, então a nossa legislação tributária terá que passar por uma transformação radical a fim de conferir lógica ao que hoje não tem lógica nenhuma. Um sistema de processamento eletrônico de dados não é um juiz que a todo instante interpreta o mesmo fato de forma diferente.

Outro aspecto que deve ser observado é se o Fisco dispõe de estofo suficiente para digerir uma estrutura de tamanha grandeza, visto ser flagrante o despreparo de muita gente que hoje ocupa até mesmo cargos estratégicos em órgãos fazendários. Empreitadas dessa magnitude não dependem somente de equipamentos caros e aquisição de tecnologia de ponta. Por mais que tente, uma criança de um ano de idade jamais conseguirá dirigir um carro. Ela terá que comer muito feijão até estar pronta para encarar o desafio. O SPED obrigará o Fisco a se elevar a um outro nível de consciência organizacional. Até que isso aconteça milhões de toneladas de feijão deverão ser consumidas.

Apesar dos pesares, não se deve subestimar as ações do Fisco. É bom lembrar que ele está municiado com artilharia de grosso calibre. O momento é oportuno para o desenvolvimento de uma inteligência fiscal interna que possa amortecer os impactos do SPED. Por enquanto, ninguém sabe exatamente que cara tem o bicho, mas os seus sinais já são perceptíveis. Ou seja, os rastros mostram que a onça é grande e deve estar faminta.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

DEDICAÇÃO

Reginaldo de Oliveira
reginaldo@reginaldo.cnt.br
Publicado no Jornal do Commercio em 08/07/2010 – Manaus/AM - pág. A3
http://www.artigo40.rg3.net/


Quando um jardim nos chama atenção a ponto de pararmos para contemplá-lo é porque mãos habilidosas lhes dedicaram muito carinho e cuidado. Em contrapartida, as flores agradecem irradiando beleza e vitalidade. Dedicar-se é transferir para o objeto da nossa atenção a parte mais nobre da essência que guardamos no fundo da alma – quanto mais nos dedicamos a uma causa, mais aguçado e criativo fica o nosso espírito. Assim como a vivacidade das flores, um trabalho bem feito produz encantamento e distinção.

Qualquer pessoa é provida de argúcia suficiente para perceber desde a concretude de uma escultura bem talhada quanto à abstrata atmosfera de um ambiente gerido com harmonia e competência. Ou seja, a dedicação adquire materialidade ostensiva ao atingir os sentidos do espectador. Portanto, o autor de uma bela obra vivencia tanto o prazer da própria realização quanto o reconhecimento público do seu trabalho. No caso das organizações formais o mérito é compartilhado por todos do ambiente laboral, visto que o efeito positivo só acontece via comprometimento dos que acreditam e apóiam uma proposta justa e inovadora.

Assim, pergunta-se por que tantas atividades diárias deixam de ser executadas com esmero; por que tanta coisa feia, mal-feita? Onde estariam as raízes desse tipo de comportamento e que estranho prazer envolve uma pessoa que faz tudo torto. Com certeza é um prazer corrosivo, danoso, que só mal faz ao seu autor. Pessoas de bem com a vida não se comprazem com atitudes desse tipo. Ao contrário, transmitem energias positivas a tudo que tocam e ao mesmo tempo são beneficiadas pela ressonância simbiótica das suas ações. Trabalhar bem faz bem; tratar bem o colega de trabalho faz bem também. Agindo dessa forma, chega-se ao final do dia com o fardo aliviado de fadigas e amarguras.

Aspectos qualitativos das atividades laborais observáveis em um trabalhador revelam uma ampla gama de características comportamentais que podem ser utilizadas como balizadores do potencial profissional. Por isso, é bom aguçar os radares para interpretar sinais advindos de pares e superiores a fim de identificar em si mesmo cacoetes ou condutas que possam denunciar falta de compromisso com os valores da empresa ou descaso com as suas crenças. De qualquer forma, uma dedicação verdadeira é capaz de atenuar eventuais mal entendidos. Com o tempo, o esforço acaba ficando patente perante todos da organização.

É comum nos ambientes organizacionais se identificar com muita facilidade o mais e o menos dedicado dos funcionários. Normalmente, a pessoa mais dedicada goza respeito dos colegas, mesmo que esteja posicionada na base do organograma. Por exemplo, a competência do office-boy em solucionar problemas embaraçosos transforma-se em tema de conversa da alta direção. Esse profissional dificilmente perderá o emprego e ainda poderá ser alçado a um cargo melhor. Casos desse tipo ocorrem em razão do trabalho feito com dedicação. No outro extremo, os descomprometidos e desconectados dos valores da empresa encabeçam a lista das oportunas reduções de quadro de pessoal.

Por conseguinte, vamos então voltar para as nuances mais sutis do nosso comportamento; fazer um exercício prático de introspecção para identificar o quanto de valor podemos agregar ao nosso desempenho profissional. Ademais, o mercado de trabalho está sedento de profissionais capazes de fazer a diferença num mercado de altíssima competitividade. Domingo passado foi manchete na imprensa local que 5.697 vagas não foram preenchidas por falta de profissionais habilitados. Dedicação também deve ser aplicada à própria carreira profissional na forma de estudo, planejamento, treinamento, capacitação, leitura, pesquisa etc. Muitas vezes, a evolução para padrões mais elevados de qualidade de vida pessoal e profissional depende unicamente de uma atitude, de uma decisão de mudar, de esforçar-se até o limite de uma catarse para então, aliviados dos paradigmas já enferrujados, possamos experimentar uma vida plena de possibilidades. Dediquemo-nos então a fazer tudo com excelência, agindo com responsabilidade e inovando sempre.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Contabilidade para não contadores

Reginaldo de Oliveira
reginaldo@reginaldo.cnt.br
Publicado no Jornal do Commercio em 10/06/2010 – Manaus/AM - pág. A4
www.artigo39.rg3.net

Ousados projetos de reestruturação organizacional ou de melhoria de controles internos desembocam em um mar de frustrações, muitas vezes, por incapacidade do gestor de abraçar uma causa com as próprias pernas. Infelizmente, a carga de responsabilidade que altos executivos suportam é muito pesada; decisões baseadas no seu discernimento e julgamento determinam os rumos que a organização deve tomar. A questão é se existe preparo suficiente para avaliação acertada de cada problema que se apresenta. Normalmente, assuntos relacionados à atividade-fim de um negócio são habilmente administrados. A coisa complica quando o gestor se vê obrigado a decidir, por exemplo, pela aquisição de um ou de outro sistema de gestão ERP, ou então desenvolver estratégias contábeis que resguarde a empresa de riscos internos e externos.

Complexas ferramentas de gestão demandam conhecimento específico; implantá-las de qualquer forma expõe a estrutura funcional a um choque desnecessário. É preciso que tal estrutura seja reforçada por uma cultura profissional adequada. Caso contrário, o processo desanda fragilizando ainda mais o ambiente.

Avaliar o desempenho de profissionais de áreas altamente especializadas sem conhecimento de causa leva o gestor a ações escalafobéticas e intempestivas. Ao profissional especializado resta o espanto frente a questionamentos tempestuosos e irracionais. De fato, lidar com a ignorância e com convicções tortuosas inviabiliza qualquer ímpeto motivacional. O resultado dessa química reversa é uma sucessão de conflitos com consequências danosas para ambos os lados.

Um bom exemplo dessa dicotomia é o ajuizamento deformado da contabilidade, sua função e utilidade para o controle do patrimônio de uma organização. Muita gente que deveria conhecer nunca se interessou por essa coisa enigmática chamada contabilidade. Por anos a fio o contador foi tido por muitos donos de empresas como o oráculo dos regulamentos tecno-fisco-tributários. Sua impenetrável linguagem técnica desencorajava aqueles que tentavam saber um pouco mais sobre o assunto. Esse tempo passou.

Contabilidade é coisa séria. Agora, muito mais. Buscar conhecimentos contábeis para melhor interagir com o contador é uma atitude saudável. Não se trata aqui de imiscuir-se na seara alheia. Apesar das muitas responsabilidades que os administradores já carregam nas costas não há como fugir de mais essa. Uma série novas exigências legais vem abarrotando as empresas de controles fiscos-contábeis e onerando seu custo administrativo. Inobservância de tantas novas exigências expõe a organização a iminentes riscos de autuações fiscais.

A estrutura conceitual do novo modelo contábil instituído pela Lei 11.638/2007 contempla maior interação das atividades do contador com as do administrador devido a conceitos de subjetividade responsável, aspecto qualitativo da informação contábil, segurança na condução da gestão etc. A colaboração de diretores e executivos em geral é muito importante para proporcionar consistência aos relatórios financeiros produzidos pelo departamento contábil.

A dupla função de atendimento fiscal e gerencial demanda, consequentemente, serviço dobrado. Tanto um quanto o outro são críticos para o bom funcionamento de um ente jurídico e os dois devem ser objeto de constante discussão e aperfeiçoamento. Além do mais, um bom embasamento contábil propicia ao gestor uma visão amplificada da sua organização. A contabilidade é um fantástico instrumento de controle do patrimônio. Quão surpresos ficam aqueles que descobrem seu inesgotável potencial de suporte à gestão. E quantos projetos de implantação de controles gerenciais seriam bem sucedidos caso administradores e contadores falassem a mesma língua.


Conhecimento contábil não é importante somente para executivos. A disseminação dos sistemas de gestão ERP demandou diversas necessidades de capacitação profissional dos operadores dessa moderna ferramenta de controle de processos. Dentre as novas habilidades requeridas, a contabilidade é uma delas. Portanto, é recomendável buscar no mercado treinamento de contabilidade para não contadores

REPERCUSSÕES DO SPED

Reginaldo de Oliveira
reginaldo@reginaldo.cnt.br
Publicado no Jornal do Commercio em 15/06/2010 – Manaus/AM - pág. A4
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Estamos no mês de entrega da Escrituração Contábil Digital (ECD) e só agora é que muitos contadores acordaram para a seriedade do assunto. Só agora estão correndo atabalhoadamente atrás de treinamentos, leituras, pesquisas etc. Só agora estão procurando os técnicos do departamento de T.I. para averiguar questões de compatibilidade e adequação. Só agora estão descobrindo que sua escrituração contábil terá que ser amplamente reformulada para passar no crivo do PVA (programa validador e assinador – IN RFB 848/2008).

O Decreto 6.022, que instituiu o SPED, data de 22/01/2007. Diversas empresas que estavam sujeitas ao acompanhamento econômico-tributário diferenciado transmitiram sua ECD ano passado. Não há então justificativa aceitável para tanta correria em cima da hora. Também não há justificativa para, nesse momento, responsabilizar outros departamentos pela inércia do contador. As ações necessárias ao cumprimento do SPED que fossem de responsabilidade dos setores de T.I. ou Financeiro, por exemplo, só poderiam ser implementadas mediante orientação do contador. Não compete a esses setores a obrigatoriedade do conhecimento de normas fisco/tributárias. Isso é uma prerrogativa do contador. Daí, que orientações pertinentes ao assunto em questão deveriam ter sido prestadas no segundo semestre de 2008, quando do planejamento da escrituração contábil de 2009.

Um dos pontos mais inquietantes da ECD está relacionado à obrigatoriedade da produção de dados analíticos. Quem escriturou contas Clientes e Fornecedores por totais movimentados terá que fazer o desdobramento em livro auxiliar. O problema é se tal cuidado não foi oportunamente observado nos controles internos de cada um dos meses de 2009. Se os devidos cuidados não foram tomados tempestivamente, será preciso agir com urgência, ou seja, fazer a composição analítica de cada período (vendas/recebimentos; compras/pagamentos). A responsabilidade pela orientação sobre a forma de adoção de procedimento que gerasse informação contábil adequada é exclusiva do contador. Isso vale para toda modificação de configuração dos controles internos e contábeis necessários ao atendimento das normatizações legais do SPED.

Vale ressaltar que a ECD base 2010, entrega 2011, demanda cuidado redobrado. A Resolução CFC 1.255, que entrou em vigor em 01/01/2010 estabeleceu importante mudança no reconhecimento contábil de receita e respectivos tributos diretos. É recomendável a leitura da seção 23 da supracitada resolução, além das 22 páginas do CPC 30. É bom verificar se o plano de contas atende às Leis 11.638/2007, 11.941/2009 e Res. CFC 1.255/2010; também, se o grupo de custo está adequadamente estruturado e se existe um eficiente controle de retenção de tributos. Há várias outras observações a fazer.

Em consideração ao processo de convergência da nossa contabilidade às normas internacionais, A Resolução CFC 1.255 aprovou a NBC T 19.41 (Contabilidade para Pequenas e Médias Empresas). O objetivo desse dispositivo legal foi encerrar a discussão sobre a adoção da contabilidade internacional para pequenas e médias empresas. Suas 255 páginas são um resumo das 43 orientações do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC). Devido à insuficiente clareza do texto, é mais adequado recorrer ao CPC correspondente de cada seção desse texto legal.

Avizinham-se ondas e mais ondas de mudanças. A Instrução Normativa RFB nº 989, de 22 de dezembro de 2009 instituiu o E-Lalur, que ainda não é obrigatório porque o governo não disponibilizou o software. A transmissão conjunta da ECD com o E-Lalur permitirá a operacionalização de um dos projetos mais ambiciosos do SPED, que é a Central de Balanços - prevista para entrar em operação ano que vem. O governo vai montar o balanço das pessoas jurídicas.

Tem mais! Está previsto SPED para empresas do lucro presumido; as contas contábeis indedutíveis do imposto de renda devem ser desdobradas; é necessária a existência de balanço de abertura em 01/01/2010 para adequação à Resolução 1.255/2009; todos os balanços deverão ser acompanhados de notas explicativas etc. Enfim, o contador precisará ter ombros semelhantes ao do mitológico Atlas para sustentar um mundo de tantas responsabilidades. Será que estamos preparados para tudo isso?



quinta-feira, 3 de junho de 2010

APOCALÍPTICO SPED

Reginaldo de Oliveira
reginaldo@reginaldo.cnt.br
Publicado no Jornal do Commercio em 03/06/2010 – Manaus/AM - pág. A3
www.artigo37.rg3.net

No dia 23 de outubro de 2001 foi publicado no DOU a IN SRF 86 que dispunha sobre informações, formas e prazos para apresentação de arquivos digitais a Receita Federal. Essa instrução normativa alcançava empresas que utilizassem sistemas de processamento eletrônico de dados para registrar negócios e atividades econômicas ou financeiras, escriturar livros ou elaborar documentos de natureza contábil ou fiscal, excluído pessoas jurídicas enquadradas no Simples. Tais arquivos digitais só eram apresentados ao fisco mediante intimação, sendo vedado o compartilhamento com outras administrações fiscais (Estados e Municípios).

Sorrateiramente, o governo, através da Emenda Constitucional nº 42, Art. 37, Inciso XXII, estabeleceu o compartilhamento de cadastros e de informações fiscais, além da atuação integrada das administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Foi aberto assim, caminho para o Decreto 6.022/2007, que instituiu o Sistema Público de Escrituração Digital, o qual foi complementado por um rol de dispositivos legais acessórios, como a IN DNRC 107/2008, Resolução CFC 1.020/2005, IN RFB 787/2007 etc.

O Art. 3º do supracitado Decreto 6.022 determina que além das administrações tributárias federal, estadual e municipal, são usuários do SPED as entidades da administração pública federal direta e indireta que tenham atribuição legal de regulação, normatização, controle e fiscalização dos empresários e das sociedades empresárias. O Art. 4º estabelece limite de competência de tais usuários e observância aos sigilos comercial, fiscal e bancário. Assim, o Banco Central terá acesso ao SPED. Também, a CVM, Ibracon, INSS; Fazendas Estaduais e Municipais. Isso, até onde se sabe. O que não se sabe é como, na prática, a coisa vai funcionar. Principalmente, se o artigo 4º vai impedir a ação de arapongas.

Daí, que um determinado órgão que receber balanço em um processo de licitação pública poderá pedir validação da peça contábil à Receita Federal. A Fazenda Municipal tem prerrogativa de se valer do repositório de dados do SPED para efetuar cruzamentos com informações colhidas em diligências fiscais. Quanto ao faminto fisco previdenciário, esse, certamente fará incursões virulentas no repositório do SPED – o suporte legal já existe. Trata-se da Lei 8.212/1991, Art. 32, Inciso II, que manda lançar mensalmente em títulos próprios da contabilidade, de forma discriminada, os fatos geradores de todas as contribuições da empresa e os totais recolhidos. Acrescenta-se a isso a obrigatoriedade da observância das 85 páginas do CPC 33 com sua complexa e filosófica definição de benefícios a empregados. Portanto, muitíssimo cuidado com a contabilização de valores que envolvam empregados e prestadores de serviços. As multas são astronômicas.

O SPED está tirando o sono de muitos empresários e o emprego de muitos contadores. Quem vinha mantendo sua contabilidade em ordem e seus processos de controle interno organizados, teve ou está tendo poucas dificuldades na digestão desse sapo gordo e enverrugado. Na realidade, o SPED é um grande teste de organização contábil e empresarial. Os profissionais que manipularam a integridade da informação contábil estão nesse momento envoltos em amarguras e tormentos para sair da areia movediça – quanto mais se mexem, mais afundam.

Não é fácil enganar o SPED. Basta lembrar que uma escrituração contábil decente deve observar grande variedade de preceitos técnicos e legais que nunca foram rigorosamente obedecidos pela maioria dos contadores. A checagem do SPED é eletrônica, o fiscal não é mais de carne e osso. Agora, ele é uma poderosa inteligência artificial. Por exemplo, o SPED tomará o saldo anterior da conta Clientes, adicionará vendas, deduzirá o saldo atual da mesma conta Clientes e cruzará o resultado com as disponibilidades. Em vista de tantas possibilidades, é muito importante confrontar dados do balanço e da DIPJ com as demais declarações apresentadas ao fisco - tudo está sendo cruzado; as chagas estão sendo expostas.

Apocalíptico: [Do grego apokalyptikós, 'que revela'] Difícil de compreender; obscuro; pavoroso; fim do mundo.