segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

CHUVA DE AUTUAÇÕES FISCAIS



















Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 28/01/2014 - A155

Não é novidade para ninguém que há muitos anos o governo vem adotando táticas confiscatórias ardilosas para sangrar o bolso do contribuinte. O modus operandi é sempre o mesmo: Primeiramente, é criado um artificioso clima de terror para assustar a população. Em seguida, surge a proposta de criação de um tributo provisório para atacar a causa do problema. Passado um tempo, alguma autoridade diz em rede nacional que não pode abdicar da nova taxação porque tal procedimento comprometeria determinados programas sociais e seus respectivos “bolsa isso”, “bolsa aquilo”. Na realidade, o governo vive um eterno jogo de xadrez onde está sempre avançando e empurrando o contribuinte contra a parede. Prova disso é a curva ascendente da arrecadação. Daqui a pouco os números não vão mais caber no painel do impostômetro. E o mais assustador é que tanto o inchaço da máquina quanto a voracidade arrecadatória não param de crescer nem por um minuto.

Pois bem. A quantidade de instrumentos disponibilizados pela legislação tributária é fabulosa. É imposto, é contribuição, é taxação que não tem fim. O contribuinte paga taxa para conservação de estradas, paga imposto para o financiamento da educação, paga contribuição para custear a saúde etc. E depois paga pedágio, paga conserto de pneu estourado no buraco, paga escola particular, paga plano de saúde etc. Portanto, ninguém sabe o que foi feito com os quase dois trilhões de reais arrecadados ano passado, porque só se vê reclamação do governo de que não existe dinheiro para investimentos básicos.

O fato mais perturbador na política tributária oficial é que o consumo é atacado com uma virulência avassaladora, ao passo que a renda é deixada em segundo plano (com exceção dos rendimentos do pobre assalariado). Ou seja, o Brasil adota uma política inversa ao que é praticada nos países desenvolvidos onde o consumo sofre pouca ou nenhuma tributação. Os grandes, os colossais contribuintes brasileiros, devem horrores ao fisco, mas todos estão tranquilos, passeando no caribe porque seus patrimônios estão protegidos pelo nosso sistema jurídico, feito, exatamente, sob medida, para garantir que os ricos não sejam incomodados. Conforme reclamação do presidente do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), senhor Heráclito Camargo, publicada na ISTO É online, de 11/12/2013, o governo vem dificultando ao máximo o trabalho dos procuradores, não lhes fornecendo sequer estrutura adequada de informática. Por consequência, o montante de R$ 1,4 trilhão inscrito em dívida ativa, mais a estimativa de R$ 400 bilhões sonegados deixam de ingressar nos cofres públicos federais. Dessa forma, O governo prefere não mexer com os magnatas ao direcionar todas as suas armas para o consumo, ficando evidente a constatação de que musculosas forças sobrenaturais estão permanentemente agindo nos bastidores.

Como se não bastasse o paiol legislativo tributário entupido de munição, o governo vem sorrateiramente investindo pesado em mais uma fonte de arrecadação. Trata-se da chuva de autuações (mais precisamente uma tempestade) por descumprimento de obrigações acessórias. Temos assistido ano após ano a um crescente desfiamento de normas e redundância de normas, todas elas carregadas de complexidades extremas. Tanto, que nenhum funcionário público compreende cem por cento, aquilo que eles mesmos criam. Nenhum deles é capaz, por exemplo, de conhecer cada vírgula de todo o projeto SPED, mas o contador da empresa, deve, sim, saber tudo. A punição é aplicada e calculada por quantidade de erro. Ou seja, cada erro, uma punição, como bem estabelecido está na Medida Provisória 627/2013. Dessa forma, um rio de dinheiro está desembocando nos cofres públicos. Quando o governo percebeu essa fabulosa fonte de recursos, ele passou a concentrar esforços na prolixidade das obrigações acessórias, justamente, porque sabe que ninguém vai conseguir cumprir e assim, irá garantir mais uma fantástica receita tributária. Pode se perceber isso pela estratosférica alavancagem do valor das multas, visto que o SPED chegou acompanhado de penalidades exorbitantes. Mesmo as pessoas correndo feito loucas de um lado para o outro para escapar das multas, a maioria continua atolada no excesso de tecnicismo burocrático contido nos manuais do SPED. O fato mais do que notório é que 99% das pessoas jurídicas não estão absolutamente preparadas para todas as exigências do SPED. Não existe cultura empresarial amadurecida na maioria das empresas brasileiras, sendo ainda o improviso a marca mais evidente.

O Amazonas, claro, não poderia ficar fora da festança. A Resolução GSEFAZ 37/2013 estabeleceu a obrigatoriedade do SPED fiscal para as microempresas. Os especialistas sabem que nenhuma dessas empresas vai cumprir cem por cento essa nova obrigação legal, visto que a maioria delas não possui estrutura de informática minimamente adequada. O SPED exige um colossal investimento em pessoas e processos, além de estrutura física e caríssimos sistemas informatizados de gestão. O seu José, coitado, vai ter que vender o mercadinho para pagar as multas decorrentes do descumprimento dessa nova obrigação criada pela SEFAZ. O contador que recebe um salário mínimo de honorário não vai passar uma semana nas dependências do cliente cadastrando NCM, CST, CFOP, alíquotas, origem, códigos de IBGE, CEP etc., etc. A monstruosidade do SPED só criou a módica quantia de quinze milhões de situações tributárias. E o seu José vai ter que saber de cada uma delas. Um CFOP errado, uma multa.

O pessoal da SEFAZ sabe muito bem o que está fazendo, mas mesmo assim está fazendo. Curiosamente, aqueles que oficialmente são os aguerridos defensores da pequena empresa, ou que assim deveriam ser; todo esse pessoal enfia a cabeça na areia, se oculta e desliga o GPS do celular. Já, na mídia aparecem vistosos, balbuciando os velhos clichês de sempre. No momento que são interpelados por alguém esclarecido eles fogem para escapar de perguntas embaraçosas. Quanto ao pequeno empresário, esse está órfão de pai e mãe.

Se todo mundo foi comprado, quem poderá nos salvar? O Ministro Joaquim Barbosa? Grande parte da culpa desse estado de coisas é da própria classe dos microempresários, que não se organiza, deixando assim o poder público à vontade para fazer o que der na telha. Um exemplo: A Resolução GSEFAZ 37/2013 foi gestada na barriga da SEFAZ por inseminação artificial, sem a participação do pessoal proprietário das microempresas. Por isso, fica no ar a pergunta: O ente tributante tem poder absoluto para fazer o que quiser? Ele pode invadir a casa e levar geladeira, televisão e a bicicleta das crianças? Será que até o Ministério Público foi abduzido?


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