Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 04/02/2014 - A156
O
aclamado escritor estadunidense Norman Mailer disse que nas democracias os
políticos exercem a força pela ética. Da mesma forma, o Estado impõe
determinações legítimas pela conduta imaculada dos seus membros. Em outubro
último uma mulher com histórico de problemas mentais foi morta a tiros pela
polícia em frente ao Congresso dos Estados Unidos, após ter tentado invadir a
Casa Branca. Se algo semelhante ocorresse em frente ao Congresso brasileiro o
país inteiro iria crucificar a nossa já desmoralizada instituição policial.
Ninguém
brinca com a polícia americana; um vacilo e ela atira. Lá, o policial é
respeitado pela população porque nenhum tipo de desvio de conduta do agente
público é tolerado. Quanto ao nosso querido Brasil, somos diariamente solapados
pela impunidade, raiz de todos os males que nos atormenta e nos revolta. Por
aqui a coisa toda é muito frouxa; a esculhambação chegou num nível calamitoso
com a bandidagem deitando e rolando sobre a inércia do poder público que
nenhuma ação eficaz promove para conter a escalada da violência. Quanto ao
câncer da corrupção, o que se verifica todos dos dias na mídia é um festival de
escândalos a pipocar num ritmo alucinante. No filme “O Lobo de Wall Street”, a
sutil e rarefeita tentativa de corrupção do investigador policial faz o mais endinheirado
dos homens tremer, face o rigor da lei. Já, em terras brasileiras, compra-se
com a maior facilidade gente de todos os calibres, de todos os escalões e de
todas as esferas públicas. É como se o poder público e a corrupção fossem
gêmeos xifópagos.
É
nesse cáustico e árido terreno moral que nasceu a lei anticorrupção. Apesar da
cobrança insistente da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) vir ocorrendo há anos, somente em 2013 é que o projeto foi
aprovado, consequência dos protestos que explodiram em junho passado. A Lei
12.846/2013 entrou em vigor quarta-feira da semana anterior (29/01/2014). Os
especialistas dizem que essa lei veio preencher a lacuna deixada pela Lei de
Improbidade Administrativa e pela Lei de Licitações. Agora, não é necessário
provar que a empresa foi envolvida em atos de corrupção. Basta haver
comprovação de existência do delito. É o tal conceito de responsabilidade
objetiva previsto na dita lei. Dessa forma, será inútil para a diretoria
afirmar que o ato praticado pelo empregado não era do seu conhecimento. A multa
pode chegar a 20% do faturamento ou alcançar a cifra de R$ 60 milhões. Casos
comprovados de corrupção poderão redundar na dissolução compulsória da empresa
ou entidade, sendo que qualquer tipo de punição incluirá o réu no cadastro
Nacional de Empresas Punidas (CNEP). E mais do que isso, a condenação
administrativa não afastará a possibilidade de punição aos dirigentes ou administradores.
Também, a empresa será impedida de receber qualquer tipo de incentivo,
empréstimo ou doação de órgãos públicos.
Interessante,
é que essa Lei 12.846 dá ao ente público o poder da ação imediata, ao passo que
ao ente privado nada de semelhante é disponibilizado. Ou seja, aquele motorista
que é achacado e ameaçado pelo fiscal num posto de fiscalização no meio da
floresta amazônica, só pode seguir adiante se pagar propina oriunda de uma
infração criada de momento pelo achacador. E se o motorista se atrever a fazer
qualquer tipo de denúncia, o sistema inteiro se voltará contra ele, enquanto
que o achacador continuará atuando livremente, sabendo que suas ações
criminosas são acobertadas por seus superiores e por todas as instâncias do
poder judiciário. Resumindo, de qualquer forma ou em qualquer situação o
contribuinte está ferrado.
A
administração municipal passada foi a pior das piores, onde abrir uma empresa
pelas vias legais era simplesmente impossível, uma vez que a contaminação da
prefeitura ia desde a ponta da unha do dedão do pé até o último fio de cabelo. E
mesmo diante de inúmeros protestos, denúncias na mídia, desabafos na Assembleia
Legislativa etc., nada fez o órgão para atender aos clamores da população. Muitos
que conseguiram abrir suas empresas, o fizeram mediante pagamento de propina,
visto ser a única alternativa existente na época. A lei anticorrupção colocou a
empresa numa sinuca de bico: Se não pagar propina o órgão não libera o
processo; se pagar propina ela pode arcar com seríssimas consequências
previstas na Lei 12.846. Por isso é que as entidades representativas do poder
econômico deveriam exigir a criação de algum mecanismo de ação imediata que
possa ser utilizado contra o agente público criminoso.
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