Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 07 / 3 / 2017 - A285
Assim
como Maquiavel destruiu a divindade do homem, os ideais que tanto veneramos não
existem. As pessoas esquecem totalmente deles quando estão no poder. Ou seja,
ninguém vai pensar nos pobres quando estiver lá em cima. Por isso os homens
públicos têm que ser vigiados de perto. Esperar sensatez e honestidade do poder
público é total perda de tempo, uma vez que decisões estapafúrdicas são
publicadas todos os dias nos diários oficiais.
Uma das mais emblemáticas aconteceu dia 21 de dezembro de 2012, último
dia de sessão legislativa da ALEAM, quando chegou um projeto de lei encaminhado
pelo governo do Amazonas que aumentava o ICMS da cesta básica em 1.700%. A
justificativa de tamanha majoração estava na necessidade de compensar uma
substantiva queda de arrecadação. Curiosamente, no mesmo período o mesmo
governo tinha encaminhado ao Legislativo outro projeto de lei criando 95 cargos
comissionados. Como então uma calamitosa falta de dinheiro pode combinar com um
aumento gigantesco de despesas absolutamente dispensáveis? Que tipo de
credibilidade pode haver nas argumentações utilizadas para o brutal aumento
tributário da cesta básica?
O
fato mais irônico dessa história dantesca está na página 52 do caderno 3 do
Programa de Educação Fiscal da Sefaz, que diz o seguinte: “O segmento mais
pobre da população é o que mais sofre com a tributação sobre o consumo” Na
página 51 pode se lê: “O atual sistema não respeita o princípio da justiça
fiscal”.
Para
transformar a humilhação numa política oficial do governo do estado do
Amazonas, a Resolução SEFAZ 11/2008 lista os produtos da nossa cesta básica.
Margarina, de até 250g. Na visão da Sefaz, o pobre jamais pode pensar em
comprar um pote de 500 gramas de margarina. A Sefaz afirma nessa dita Resolução
que o pobre não pode consumir leite em pó; somente um subproduto misturado com
soro que tem um cheiro esquisito – e que não ultrapasse 400 gramas. Pobre tem é
que comer pouco, segundo a opinião da Sefaz. Quanto ao frango, tem que ser
inteiro. Essa coisa de comprar peito ou coxa de frango é privilégio de rico.
Pobre tem mais é que ficar se batendo com um frango congelado até despedaçá-lo.
Salsicha, só em lata. Na opinião dos funcionários da Sefaz o pobre só pode
comer aquela salsicha embranquecida que parece defunto mergulhado em salmoura.
No Rio de Janeiro a quantidade de itens da cesta básica é quatro vezes maior,
contendo até salmão, bacalhau, linguiça, escova, creme dental, papel higiênico,
sabonete etc. (Lei 4.892/2006). Na lista do Amazonas não tem escova, nem creme
dental, nem sabonete, nem papel higiênico etc. Ou seja, na opinião oficial do
Governo Estadual o pobre amazonense não precisa tomar banho nem escovar os
dentes nem limpar a...
Não
bastasse tanta humilhação sobre aqueles que colocaram o governador no poder, o
Decreto 33.082/2013 revogou a taxação de 1% da cesta básica contida no Decreto
23.994/2003.
Pois
é. Um milagre aconteceu por esses dias; parece que uma luz divina atravessou o
planeta. O Decreto 37.662, de 22 de fevereiro de 2017, reduziu de 18% para 4% o
ICMS da cesta básica. Mesmo que os efeitos dessa disposição normativa só
comecem em abril e mesmo que dependam de regulamentação complementar, esse decreto
corrige um erro vergonhoso, visto que o Amazonas era o único estado que não
respeitava o princípio da essencialidade. A Sefaz argumenta que a população em
nada será beneficiada com essa drástica redução tributária e que o comerciante
embolsará a vantagem taxativa por não repassar a desoneração fiscal ao
consumidor. O empresário é SEMPRE o vilão da história. É bom lembrar que a
culpa disso tudo é do próprio poder público que inventou uma armadilha
tributária para engabelar o consumidor de produtos e serviços. Essa engabelação
está representada por vários tributos que incidem sobre a mesma base (bis in
idem). Pra não ficar tão escandalosamente ostensivo, o Fisco criou o sistema de
tributos “por dentro”. Desse modo, o consumidor não consegue enxergar o tamanho
da facada. Como a coisa é escondida, não é possível constatar se ICMS Pis
Cofins foram ou não injetados no preço da mercadoria. Se a tributação fosse
“por fora” não haveria espaço para conjecturas ou acusações levianas. Curta
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